No fecho de sua
experiência com as “sete solidões”, Zaratustra converte-se numa espécie de
fanal, na tentativa de atrair “navegantes sem rumo” – isto é, outras tantas
almas solitárias – para a sua morada, no cume de uma ilha entre dois mares, lá
onde, em tese, teria atingido o ápice de sua pungente busca por sabedoria.
Não há como se
abstrair o fato de que a poesia de Nietzsche acha-se fortemente permeada por
conteúdos autobiográficos, digo melhor, por deduções, inferências e intuições que
conformam grande parte do seu pensamento filosófico: linguagem e subjetividade
à flor da pele, solidão e sofrimento que poderiam ser prognosticados como uma
jornada catártica para uma vida de afirmação.
J.A.R. – H.C.
Friedrich Nietzsche
(1844-1900)
Das Feuerzeichen
Hier, wo zwischen
Meeren die Insel wuchs,
ein Opferstein jäh
hinaufgethürmt,
hier zündet sich
unter schwarzem Himmel
Zarathustra seine
Höhenfeuer an,
Feuerzeichen für
verschlagne Schiffer,
Fragezeichen für
Solche, die Antwort haben...
Diese Flamme mit
weissgrauem Bauche
– in kalte Fernen
züngelt ihre Gier,
nach immer reineren
Höhen biegt sie den Hals –
eine Schlange gerad
aufgerichtet vor Ungeduld:
dieses Zeichen
stellte ich vor mich hin.
Meine Seele selber
ist diese Flamme,
unersättlich nach
neuen Fernen
lodert aufwärts,
aufwärts ihre stille Gluth.
Was floh Zarathustra
vor Thier und Menschen?
Was entlief er jäh allem
festen Lande?
Sechs Einsamkeiten
kennt er schon –,
aber das Meer selbst
war nicht genug ihm einsam,
die Insel liess ihn
steigen, auf dem Berg wurde
er zur Flamme,
nach einer siebenten
Einsamkeit
wirft er suchend
jetzt die Angel über sein Haupt.
Verschlagne Schiffer!
Trümmer alter Sterne!
Ihr Meere der
Zukunft! Unausgeforschte Himmel!
nach allem Einsamen
werfe ich jetzt die Angel:
gebt Antwort auf die
Ungeduld der Flamme,
fangt mir, dem
Fischer auf hohen Bergen,
meine siebente, letzte
Einsamkeit! – –
In: “Dionysos-Dithyramben”
(1888)
Homem solitário
(Uwe Wenzel: artista
alemão)
O Fanal
Aqui, onde entre
mares cresceu a ilha,
pedra de ara súbito
como torre erguida,
aqui acende sob um
negro céu
Zaratustra os seus
fogos das alturas, –
fanal pra navegantes
sem rumo,
ponto de interrogação
para os que têm resposta...
Esta chama de ventre
esbranquiçado
– sua cobiça lança
línguas a distâncias frias,
dobra o pescoço para
alturas sempre mais puras –
cobra erguida a pino,
de impaciência:
este sinal o pus eu
em frente a mim.
A minha própria alma
é esta chama:
insaciável de
distâncias novas,
lança ao alto, ao
alto o seu ardor silente.
Porque fugiu
Zaratustra dos bichos e dos homens?
Porque se escapou de
repente de toda a terra firme?
Sete solidões conhece
ele já –,
mas o próprio mar não
lhe era solitário bastante,
a ilha deixou-o
subir, sobre o monte ele se fez chama,
a uma sétima
solidão
lança buscando agora
o seu anzol por sobre a fronte.
Navegantes sem rumo!
Destroços de astros velhos!
Ó mares do futuro! Ó
céus inexplorados!
lanço agora o anzol a
tudo o que é solitário:
dai resposta à
impaciência da chama,
agarrai para mim,
pescador nos altos montes,
a minha sétima, última
solidão! – –
Em: “Ditirambos Dionisíacos”
(1888)
Referência:
NIETZSCHE, Friedrich.
Das feuerzeichen / O fanal. Tradução de Paulo Quintela. In: __________. Poemas.
Antologia, versão portuguesa, prefácio e notas de Paulo Quintela. 3. ed.
revista. Coimbra, PT: Centelha, 1986. Em alemão: p. 34; em português: p. 35. (Coleção
‘Poesia: autores universais; v. 2)
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