Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

Mary Oliver - Anjos

Oliver põe-se a refletir sobre a realidade tal como a experimentamos, ou melhor, não a realidade em sua natural e presumida essência, senão a que resulta da atividade de nossa consciência: indaga-se a autora sobre as razões pelas quais se deva assumir posições definitivas acerca do que quer que seja, se não há plena equivalência entre as duas coisas?!

 

Com efeito, a poetisa afirma deter muitas dúvidas e poucas certezas, pondo em xeque, pelo menos para si, o assertivo dualismo cartesiano: a partir de um “segundo nível”, entrelaçam-se os dados do mundo e os da consciência, a experiência e a linguagem, o poema e o leitor – suscitando o aparecimento de “anjos” nesse território de elusivos matizes, tão “reais” quanto qualquer coisa capturada pelos sentidos.

 

J.A.R. – H.C.

 

Mary Oliver

(1935-2019)

 

Angels

 

You might see an angel anytime

and anywhere. Of course you have

to open your eyes to a kind of

second level, but it’s not really

hard. The whole business of

what’s reality and what isn’t has

never been solved and probably

never will be. So I don’t care to

be too definite about anything.

I have a lot of edges called Perhaps

and almost nothing you can call

Certainty. For myself, but not

for other people. That’s a place

you just can’t get into, not

entirely anyway, other people’s

heads.

 

I’ll just leave you with this.

I don’t care how many angels can

dance on the head of a pin. It’s

enough to know that for some people

they exist, and that they dance.

 

Dois anjos flutuando

(Johann von Schraudolph: pintor alemão)

 

Anjos

 

Podes ver um anjo a qualquer momento

e em qualquer lugar. Claro que tens

de abrir os olhos a uma espécie de

segundo nível, mas não é realmente

difícil. Toda a questão do que

é e do que não é a realidade

nunca foi resolvida e, provavelmente,

jamais o será. Por isso, não cuido em ser

definitiva demais sobre o que quer que seja.

Tenho muitas fronteiras chamadas Talvez

e quase nada que se possa nomear

como Certeza. Para mim, embora não

para outras pessoas. Essa é uma região

onde simplesmente não se pode entrar, pelo

menos não inteiramente, na cabeça

de outras pessoas.

 

Deixo-te apenas com isto.

Não me importa saber quantos anjos podem

dançar na cabeça de um alfinete. Basta saber

que, para algumas pessoas,

eles existem, e que dançam.

 

Referência:

 

OLIVER, Mary. Angels. In: Blue horses. New York, NY: The Penguin Press, 2014. p. 15.

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