Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 3 de dezembro de 2023

Johannes Bobrowski - Moinho de Vento

Versos que mesclam perspectivas nostálgicas a outras que albergam esboços de cenários naturais – muito provavelmente evocados pelo poeta a partir de suas próprias memórias –, suscitam no leitor intensos efeitos visuais e sonoros, a par de uma alocução a apontar para a indefectível chegada do inverno, tornando a cena pictoricamente menos variada em seus matizes.

 

Transpondo sobranceiramente a cena, o “Moinho de Vento” do título – “hirto e velho” –, como se quisesse avultar aos olhos do falante a sua presença cansada, mas serena e resiliente, convenientemente acomodada no intercepto de terra, céu e água, enquanto, à volta, as pessoas tornam-se protagonistas de uma história que ele testemunha e compila em seu cartapácio de dias.   

 

J.A.R. – H.C.

 

Johannes Bobrowski

(1917-1965)

 

Windmühle

 

Licht,

schäumendes Licht,

über der Ebene, steil,

Berg aus Glanz, ungeheures

Rauschen, es fliegen die Stürme,

atmend von Blitzen, die schreckliche Wand

steigt an den Himmel.

 

Über die Düne,

vom Meer,

im baumlosen Schwemmland

bin ich gegangen,

schattenlos, traumlos, ich ging

mit den Schnittern, es stand die Mühle

starr und alt. Nun mit grauen

Flügeln greift sie die Lüfte.

Lautlos hebt sie sich auf überm Land.

 

Mit den Reihern davon

fährt sie, groß vor den weißen

Himmeln. Wild aus der Ferne

glänzt ihr das Auge

des Winters nach.

 

Eisvogel Herz,

aus Gräten und Flossen

bau dein Nest in der Höhlung,

im flüsternden Blut.

Bei den Kindern der Ebene, Töchtern und Söhnen,

bleib, bei den kleinen Schatten

aus Liedern und Tänzen, du

halt ein Novembergras

gegen den Schnee.

 

(6.8.1959)

 

Moinho de Vento

(Giorgio Gosti: pintor italiano)

 

Moinho de Vento

 

Luz,

luz espumejante

sobre a planície, íngreme,

montanha de brilho, fundo

marulhar, voam tempestades,

respirando relâmpagos, a terrível parede

ergue-se até ao céu.

 

Desci

pela duna

vindo do mar,

pela terra de aluvião nua de árvores,

sem sombra, sem sonho, fui

com os ceifeiros, o moinho erguia-se

hirto e velho. Agora, as velas

cinzentas agarram os ares.

Silencioso, sobe e domina a terra.

 

Com as garças levanta

voo, grande no fundo dos céus

brancos. Bravio, da distância

responde-lhe o brilho do olhar

do inverno.

 

Coração, pássaro dos gelos,

com espinhas e barbatanas

faz o teu ninho na caverna,

no sangue sussurrante.

Fica com as gentes da planície, filhas e

filhos, com as pequenas sombras

de canções e danças, fica e

ergue uma erva de Novembro

contra a neve.

 

(6.8.1959)

 

Referência:

 

BOBROWSKI, Johannes. Windmühle / Moinho de vento. Tradução de João Barrento. In: __________. Como um respirar: antologia poética. Edição bilíngue. Selecção, tradução introdução e notas de João Barrento. Lisboa, PT: Edições Cotovia, 1990. Em alemão: p. 24 e 26; em português: p. 25 e 27.

Nenhum comentário:

Postar um comentário