Aparentemente em uma
paragem na Índia – Paz lá esteve como embaixador do México –, o falante escala
uma colina e encontra escombros de um monumento abandonado, dedicado a Buda, já
com a face coberta por sedimentos e formigas transitando de cima a baixo: preservado,
nada obstante, o sorriso iluminado do mestre religioso – “Transit umbra, lux
permanet”.
O poema se encerra
fazendo um paralelo entre a efemeridade extrínseca à voz lírica – os aludidos
escombros são a marca indelével dos efeitos incontornáveis do tempo – e a
fugacidade daquele momento, ou, sincronicamente, a sua própria impermanência,
metaforizada pelo “vento diáfano que se detém, gira sobre si mesmo e se dissipa”.
J.A.R. – H.C.
Octavio Paz
(1914-1998)
La cara y el viento
Bajo un sol
inflexible
llanos ocres, colinas
leonadas.
Trepé por un breñal
una cuesta de cabras
hacia un lugar de
escombros:
pilastras desgajadas,
dioses decapitados.
A veces, centelleos
subrepticios:
una culebra, alguna
lagartija.
Agazapados en las
piedras,
color de tinta
ponzoñosa,
pueblos de bichos
quebradizos.
Un patio circular, un
muro hendido.
Agarrada a la tierra
– nudo ciego,
árbol todo raíces –
la higuera religiosa.
Lluvia de luz. Un
bulto gris: el Buda.
Una masa borrosa sus
facciones,
por las escarpaduras
de su cara
subían y bajaban las
hormigas.
Intacta todavía,
todavía sonrisa, la
sonrisa:
golfo de claridad
pacífica.
Y fui por un instante
diáfano
viento que se
detiene,
gira sobre sí mismo y
se disipa.
Paisagem com ruínas e
figuras clássicas
(Marco Ricci: pintor
italiano)
O rosto e o vento
Sob um sol implacável
planícies ocres, fulvas
colinas.
Escalei por uma
brenha uma encosta de cabras
até um lugar de
escombros:
pilastras
despedaçadas, deuses decapitados.
Às vezes, cintilações
sub-reptícias:
uma serpente, um
lagarto.
Escondidos nas
pedras,
cor de tinta tóxica,
colônias de insetos
quebradiços.
Um pátio circular, uma
parede fendida.
Agarrada à terra – nó
cego,
árvore toda raízes –
a figueira religiosa.
Chuva de luz. Um
vulto cinzento: o Buda.
Suas feições uma
massa de sedimentos;
pelas escarpas de seu
rosto
subiam e desciam as
formigas.
Ainda intacto,
ainda a sorrir, o
sorriso:
golfo de claridade
pacífica.
E fui por um instante
diáfano
vento que se detém,
gira sobre si mesmo e
se dissipa.
Referência:
PAZ, Octavio. La cara
y el viento. In: __________. Obras completas. Obra poética II:
1969-1998. Árbol adentro: 1976-1988. Tomo XII. Edición del autor. 1. ed.
México, DF: Fondo de Cultura Económica, 2004. p. 143. (‘Letras Mexicanas’)
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