Batizado, casamento e
funeral – nessa ordem – são ritos religiosos no âmbito do cristianismo,
correspondendo aos intitulados “três enigmas” a que se reporta o escritor gaúcho:
risos e choros se lhes associam, mas não em primeira mão em relação ao morto, de
quem somente desponta uma “aparente calma”.
“Pranto inútil!
Sorriso miserando!”, diz a voz lírica, perguntando-se qual deles é o menos
desgraçado: quanto ao pranto, à luz do poema, relaciona-se quer ao choro da
criança – de presumível alegria –, quer ao pesar dos conjecturáveis familiares
do morto – decerto de tristeza –; o riso, aos noivos.
Na linha temporal de
um ciclo de vida, do recém-nascido ao morto, o poeta parece estar à procura não
da melhor conjuntura, senão da menos pior, estando já na maturidade e tudo julgando
com um certo ceticismo. Se duvidar, penso que ele poderia estar achando que o
morto se encontra em melhor condição.
J.A.R. – H.C.
Múcio Teixeira
(1857-1926)
Três Enigmas
Na mesma igreja
entravam nesse instante
O enterro, o
casamento e o batizado;
Riam os noivos,
soluçava o infante,
E o morto – duro,
inerte, enregelado.
Chorava a pequenina
criatura,
Ao receber a graça do
batismo;
E sorriam os noivos
na loucura
De quem dança nas
bordas dum abismo!...
Só não chorava nem
sorria o morto:
Os mortos têm essa aparente
calma
Dos velhos nautas,
que ao entrar num porto
Nada revelam do que
sentem n’alma.
E eu disse então comigo,
contemplando
O pranto, o riso, e
esse caixão fechado:
Pranto inútil! sorriso
miserando!
Qual é deles o menos
desgraçado?
O Batismo
(Pietro Longhi:
pintor italiano)
Referência:
TEIXEIRA, Álvaro de Múcio.
Três enigmas. In: __________. Poesias: tomo II. Rio de Janeiro: H.
Garnier, 1903. p. 220-221.
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