Se o poeta afirma que
“uma pedra é uma pedra”, não é que tencione incorrer numa tautologia sem
sentido, senão apenas confrontar o estado de um ente material que, sob uma
ótica uniforme, não se reveste de vontades, e a condição humana, também assente
sobre uma realidade tangível, corporal, mas, antes de tudo, sujeita a desassossegos,
como o temor da morte e a axiomática finitude que a acompanha.
Em pugna contra essa
perspectiva de finitude é que o homem se inventa e reinventa, porque nada mais
semelhante à morte do que o inerte: a mente se ocupa em transformar-se, em ser,
muitas vezes em ter, gerando uma batelada de ocupações para entreter-se e, momentaneamente,
esquecer que num determinado dia há de se deparar com Thanatos.
J.A.R. – H.C.
Ferreira Gullar
(1930-2016)
Uma pedra é uma pedra
uma pedra
(diz
o filósofo, existe
em si,
não para si
como nós)
urna pedra
é uma pedra
matéria densa
sem qualquer luz
não pensa
ela é somente sua
materialidade
de cousa:
não ousa
enquanto o homem é uma
aflição
que repousa
num corpo
que ele
de certo modo
nega
pois que esse corpo
morre
e se apaga
e assim
o homem tenta
livrar-se do fim
que o atormenta
e se inventa
Calhau à beira-mar
(Carol Greenwood:
pintora escocesa)
Referência:
GULLAR, Ferreira. Uma
pedra é uma pedra. Cuadernos hispano-americanos, literatura brasileña
hoy / literatura brasileira hoje, edición bilingüe (portugués x español), Madrid
(ES), n. 735, p. 129, sep. 2011. Disponível neste endereço. Acesso em: 14 jul.
2023.
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Olá, conheci seu blog por um acaso e gostei muito.
ResponderExcluirParabéns, é um blog muito rico.
Abraço mineiro.
Prezada Larissa: agradeço-lhe muito as palavras. Servem-me como um precioso incentivo para manter este blog pelo tempo que me houver disponível.
ExcluirUm abraço,
João A. Rodrigues