Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 8 de julho de 2023

Hermann Hesse - Lendo um Antigo Filósofo

Em linha com o tema de muitos poemas já aqui postados – o caráter efêmero de todo ciclo vital –, estas linhas de Hesse difundem o seu contumaz e extremamente aguçado sentimento do limitado e do ilusório em relação às coisas deste mundo, que a sucessão de vida e morte ata e desata.

 

Nada obstante, persiste aquela vã esperança de que algo associado à nossa viagem por este oceano informe se conecte a fins mais estáveis, melhor seria dizer, perduráveis e de natureza superior: o ente lírico não nomeia o “antigo filósofo”, embora se possa presumir a figura de Platão por trás desse ideal consciente de sua própria relatividade.

 

J.A.R. – H.C.

 

Hermann Hesse

(1877-1962)

 

Beim Lesen in einem alten Philosophen

 

Was gestern noch voll Reiz und Adel war,

Jahrhundertfrucht erlesener Gedanken,

Plötzlich erblaßt’s, wird welk und Sinnes bar

Wie eine Notenschrift, aus deren Ranken

 

Man Kreuz und Schlüssel löschte; es entwich

Aus einem Bau der magische Schwerpunkt; lallend

Wankt auseinander und zerlüdert sich,

Was Harmonie schien, ewig widerhallend.

 

So kann ein altes weises Angesicht,

Das liebend wir bewundert, sich zerknittern

Und todesreif sein geistig strahlend Licht

In kläglich irrem Fältchenspiel verzittern.

 

So kann ein Hochgefühl in unsern Sinnen

Sich, kaum gefühlt, verfratzen zu Verdruß,

Als wohne längst schon die Erkenntnis innen,

Daß alles faulen, welken, sterben muß.

 

Und über diesem eklen Leichentale

Reckt dennoch schmerzvoll, aber unverderblich,

Der Geist voll Sehnsucht glühende Fanale,

Bekriegt den Tod und macht sich selbst unsterblich.

 

Nov. 24 , 1936

 

O Filósofo

(José de Ribera: pintor espanhol)

 

Lendo um Antigo Filósofo

 

O que ontem possuía encantos e nobreza,

Fruto de séculos de pensamentos raros,

De chofre empalidece, murcha e perde o sentido,

Como as claves de uma partitura

 

Em que apagamos claves, sustenidos;

Desapareceu de um edifício

O centro mágico de gravidade,

A gaguejar vacila, desmorona,

Num eterno ecoar,

O que tinha aparência de harmonia.

 

Assim também um rosto

Velho e cheio de sabedoria,

Que idolatrávamos,

Amarrota-se e, pronto para a morte,

Tremula sua fulgurante luz espiritual,

Em um jogo lastimoso e erradio

De rugas miudinhas.

 

Assim também um elevado sentimento

Pode em nossos sentidos, num instante,

Em esgares transformar-se em dissabor,

Como se há muito possuísse dentro de si

O saber de que tudo apodrece,

Tudo tem de murchar e de morrer.

 

E sobre esse nojento vale de cadáveres

Se estira dorido e, no entanto, incorrupto,

O espírito saudoso de fanais ardentes,

Combate a morte e torna-se imortal.

 

24 de novembro de 1936

 

Referências:

 

Em Alemão

 

HESSE, Hermann. Beim lesen in einem alten philosophen. In: __________. Die gedichte: 1892-1962. 19. auflage. Frankfurt am Main, DE: Suhrkamp, 1977. s. 332.

 

Em Português

 

HESSE, Hermann. Lendo um antigo filósofo. Tradução de Lavinia Abranches Viotti e Flávio Vieira de Souza. In: __________. O jogo das contas de vidro. 7. ed. Tradução de Lavinia Abranches Viotti e Flávio Vieira de Souza. Rio de Janeiro, RJ: BestBolso, 2017. p. 521-522.

 

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