Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 28 de julho de 2023

Eduardo Guimarães - Doçura de estar só...

Há quem, como o ente lírico, se agrade em estar só, não que essa seja a melhor alternativa a estar mal-acompanhado (rs), senão porque em tais momentos o falante pode usufruir, compenetrado, dos vestígios que marcaram as horas, frescas ou remotas, de festins durante os quais – à leitura de alguns versos – se presumem saraus musicais, talvez melhor, algo como performances ao piano, em salas decoradas com requinte.

 

A bem dizer, o substrato poético é bem mais enovelante que isso, pois que se distende a uma atmosfera de sonho, em meio ao silêncio e à solidão, tudo bastante à maneira dos protótipos simbolistas: um repertório de sensações molda a textura da “torre de marfim” em que enclausurado o poeta, demarcando o perímetro de seu universo interior – plaga na qual abunda o seu pasmo de viver.

 

J.A.R. – H.C.

 

Eduardo Guimarães

(1892-1928)

 

Doçura de estar só...

 

Doçura de estar só quando a alma torce as mãos!

– Oh! doçura que tu, silêncio, unicamente

sabes dar a quem sonha e sofre em ser o Ausente,

ao lento perpassar destes instantes vãos!

 

Doçura de estar só quando alguém pensa em nós!

De amar e de evocar, pelo esplendor secreto

e pálido de uma hora em que ao Seu lábio inquieto

florescer, como um lírio estranho, a Sua voz!

 

E os lustres de cristal! E as teclas de marfim!

E os candelabros que, olvidados, se apagaram!

E a saudade, acordando as vozes que calaram!

Doçura de estar só quando finda o festim!

 

Doçura de estar só, calado e sem ninguém!

Dolência de um murmúrio em flor que a sombra exala,

sob o fulgor da noite aureolada de opala

que uma urna de astros de ouro ao seio azul sustém!

 

Doçura de estar só! Silêncio e solidão!

Ó fantasma que vem do sonho e do abandono,

dá-me que eu durma ao pé de ti do mesmo sono!

Fecha entre as tuas mãos as minhas mãos de irmão!

 

Em: “Divina quimera” (1916)

 

Homem a sós

(Uwe Wenzel: artista alemão)

 

Referência:

 

GUIMARÃES. Eduardo. Doçura de estar só... In: JUNKES, Lauro (Seleção e Prefácio). Roteiro da poesia brasileira: simbolismo. São Paulo, SP: Global, 2006. p. 140.

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