Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 29 de julho de 2023

Emily Dickinson - Em meu cérebro senti um funeral

Como se estivesse experimentando um pesadelo, ecoa na mente da voz lírica acordes de um tambor marcando a cadência de um serviço fúnebre – de seu próprio corpo físico ou, talvez melhor, de sua consciência, lucidez, faculdades de juízo –, reforçados pelo rangido produzido pelos passos, sobre um piso de tábuas, daqueles que da procissão participam, calçados com botas de chumbo.

 

“Naufragada e solitária”, toldada em sua razão, confrangida até, a falante, depois que se parte uma das tábuas do assoalho, submerge em um mundo que, a cada mergulho, finda por compreender – o lugar de seu descanso final –, não exatamente caracterizado ou descrito, mas que se pode inferior pela sequência dos versos.

 

J.A.R. – H.C.

 

Emily Dickinson

(1830-1886)

 

I Felt a Funeral, in my Brain

 

I felt a funeral, in my brain,

And mourners to and fro

Kept treading – treading – till it seemed

That sense was breaking through.

 

And when they all were seated,

A Service, like a drum,

Kept beating – beating – till I thought

My mind was going numb.

 

And then I heard them lift a box

And creak across my soul

With those same boots of lead, again,

Then space began to toll,

 

As all the heavens were a bell,

And being, but an ear,

And I, and silence, some strange race,

Wrecked, solitary, here.

 

And then a plank in reason, broke,

And I dropped down, and down.

And hit a world, at every plunge,

And finished knowing then.

 

O funeral de uma jovem na Riviera

(Hugh Cameron: pintor escocês)

 

Em meu Cérebro Senti um Funeral

 

Em meu cérebro senti um funeral

Aqui e ali carpideiras caminhando –

Caminhando – até que súbito o significado

Daquilo pareceu-me desvendado.

 

E quando todos estavam sentados

Um Ofício, como um tambor,

Batendo, batendo, me fez supor

Que minha razão se havia turbado.

 

Então ouvi que um caixão era erguido

E em minha alma rangia

Com aquelas mesmas pisadas de chumbo

E que o espaço plangia,

 

Como se o firmamento todo fosse um sino

E o Altíssimo, em si, um só ouvido.

E eu, o silêncio, alguma espécie estranha,

Naufragada, solitária, aqui.

 

Em minha mente partiu-se uma tábua

E cai. Fui descendo, descendo,

Cada mergulho me levou a um mundo

E então terminei compreendendo.

 

Referência:

 

DICKINSON, Emily. I felt a funeral, in my brain / Em meu cérebro senti um funeral. Tradução de Idelma Ribeiro de Faria. In: FARIA, Idelma Ribeiro de (Tradução e ensaios). T. S. Eliot, Emily Dickinson e René Depestre: seleção. São Paulo, SP: Hucitec, 1992. Em inglês: p. 102; em português: p. 103. (Coleção ‘Literatura Estrangeira’; v. 1)

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