Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 21 de maio de 2023

Rainer Maria Rilke - II, 1: Respirar, invisível dom – poesia!

O sujeito lírico personifica nitidamente a respiração, a transportar ideias e ideais, íntimas e ressonantes palavras, num fluxo e refluxo contínuo como o da cinética marinha: trata-se de manter-se vivo por meio da expressão poética, transcender, aperfeiçoar-se em imersão diuturna nessa câmara de ar – lídima testemunha da energia criativa do poeta.

 

As coisas mudam e, no entanto, parecem sempre as mesmas, assumindo ao olhar do falante certo arroubo espiritualista, autêntico e personalíssimo, cinzelado indelevelmente nas linhas do poema: a face mais íntima de nosso alento talvez nos fale do quanto são plenamente conexas todas as formas de vida, ou melhor, tudo quanto nos chega à consciência. Quem sabe?!

 

J.A.R. – H.C.

 

Rainer Maria Rilke

(1875-1926)

 

II, 1

 

Atmen, du unsichtbares Gedicht!

Immerfort um das eigne

Sein rein eingetauschter Weltraum. Gegengewicht,

in dem ich mich rhythmisch ereigne.

 

Einzige Welle, deren

allmähliches Meer ich bin;

sparsamstes du von allen möglichen Meeren, –

Raumgewinn.

 

Wieviele von diesen Stellen der Räume waren schon

innen in mir. Manche Winde

sind wie mein Sohn.

 

Erkennst du mich, Luft, du, voll noch einst meiniger Orte?

Du, einmal glatte Rinde,

Rundung und Blatt meiner Worte.

 

Im: “Die Sonette an Orpheus” (1923)

 

As ondas rompendo

(Claude Monet: pintor francês)

 

II, 1

 

Respirar, invisível dom – poesia!

Permutação entre o espaço infinito

e o ser. Pura harmonia

onde em ritmos me habito.

 

Única onda, onde me assumo

mar, sucessivamente transformado.

De todos os possíveis mares – sumo.

Espaço conquistado.

 

Quantas dessas estâncias dos espaços

Estavam já em mim. E quanta brisa

como um filho em meus braços.

 

Me reconheces, ar, nas tuas velhas lavras?

Outrora casca lisa,

céu e folhagem das minhas palavras.

 

Em: “Sonetos a Orfeu” (1923)

 

Referência:

 

RILKE, Rainer Maria. II, 1: Atmen, du unsichtbares gedicht! / II, 1: Respirar, invisível dom – poesia!. Tradução de Augusto de Campos. In: CAMPOS, Augusto de (Tradução e Introdução). Irmãos germanos: poemas traduzidos de Paul Fleming et alii. Florianópolis, SC: Editora Noa Noa, 1992. Em alemão e em português: p. 37.

 

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