O poeta lança mão de
um “clássico” da forma poética – um soneto com versos alexandrinos – para, segundo
ele próprio, lavrar versos que, a termo, seriam inúteis, ante o propósito maior
de falar de amor à sua “pastora” (veja-se, um vocábulo alusivo à amada, que,
não sem razão, remete aos autores arcádicos, embora estes, a par de se deterem,
por igual, sobre o mesmo molde gráfico do poema, preferissem no âmbito pátrio,
salvo engano, os versos decassílabos).
Metalinguístico e, ao
mesmo tempo, lírico, o fato é que o soneto revela a mestria de Secchin na
elaboração ideada de suas linhas, numa arquitetura que se pretende, na
aparência, fluida, fixada na página sem grande esforço ou refrega, mas que, a
sério, presume-se resultante de um exaustivo labor, quiçá ultimado pela ajuda
providencial do recorrido “deus frecheiro”. (rs)
J.A.R. – H.C.
Antonio Carlos
Secchin
(n. 1952)
Uma palavra, outra
mais, e eis um verso
Uma palavra, outra
mais, e eis um verso,
Doze sílabas a dizer
coisa nenhuma.
Esforço, limo,
devaneio e não impeço
Que este quarteto
seja inútil como a espuma.
Agora é hora de ter
mais seriedade,
Senão a musa me dará
o não eterno.
Convoco a rima, que
me ri da eternidade,
Calço-lhe os pés, lhe
dou gravata e um novo terno.
Falar de amor, oh
pastora, é o que eu queria,
Mas os fados já
perseguem teu poeta,
Deixando apenas a
promessa da poesia,
Matéria bruta que não
cabe no terceto.
Se o deus frecheiro
me jogasse a sua seta,
Eu tinha a chave pra
trancar este soneto.
A Musa Verde
(Albert Maignan: pintor
francês)
Referência:
SECCHIN, Antonio
Carlos. Uma palavra, outra mais, e eis um verso. In: HOLLANDA, Heloisa Buarque
(Org.). 26 poetas hoje: antologia.
6. ed. Rio de Janeiro, RJ: Aeroplano Editora, 2007. p. 132.
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