O que há de melhor
neste soneto de Mattoso é o parecer que declina sobre as vicissitudes das traduções,
sobretudo em matéria de poesia: “se são fiéis, não são belas; se belas, infiéis”.
Afinal, só quem se pôs diante da tarefa de traduzir poemas metrificados e
rimados em outros idiomas é capaz de avaliar o quão árduo é o mister do tradutor
para trazer ao vernáculo pátrio a ideia, o ritmo, a métrica e o esquema de
rimas do original!
No mais, é a contumaz
glosa do poeta paulistano, sempre a denotar algum sentido erótico: se cisma na definição
do que sejam as mulheres, deixo a elas que teçam os seus pertinentes
comentários! Afinal, fidelidade não seria um atributo encontrável entre belas
mulheres?
J.A.R. – H.C.
Glauco Mattoso
(n. 1951)
Ao Pé da Letra
Mulheres são
mulheres. Traduzindo,
são como as
traduções: se são fiéis
não são belas; se belas,
infiéis.
E quanto ao tradutor,
nenhum é lindo.
Algumas belas damas
vivem rindo.
Apenas desempenham
seus papéis.
Têm sempre um par de
homens a seus pés,
mas cada um chupando
um dedo mindo.
E os outros dedos,
quem os vai chupar?
E a sola, tão sedosa,
quem lambeu?
E o peito? O
tornozelo? O calcanhar?
De minha parte, digo:
não sou eu.
Não sou de belas
damas desdenhar,
mas, mais do que a
Julieta, sou Romeu.
Mulheres
(Vishal Gurjar:
artista indiano)
Referência:
MATOSO, Glauco. Ao pé
da letra. In: ROSA, Jaime B. (Ed.). Antología de poesía brasileña. Edición
bilingüe: portugués x español. 1. ed. Madrid, ES: Huerga y Fierro Editores,
feb. 2007. p. 28.
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário