Embora haja nestes
versos de Bernstein suficiente interconexão cultural entre os dois lados do
Atlântico, particularmente entre EUA e a Rússia, buscar um significado mais
amplo para o todo do poema parece-me algo despropositado, pois a aparente
intenção maior do poeta é fazer-nos saltar de um verso a outro – em meio à
sucessão intercalada de fatos, pensamentos ou constatações –, tal como se estivéssemos
dançando um... balé.
Veja-se que a própria
distribuição gráfica dos versos do poema sobre a página sugere tal propósito, eis
que alguns deles partem da margem original, enquanto outros alongam-se um, dois
ou três passos à frente. Seja como for, apresento abaixo o comentário dos editores
da obra em referência, acerca do poema em epígrafe, para que o leitor possa,
então, chegar às suas próprias conclusões.
O título do poema significa
“Balé Russo” em francês. Les “Ballets Russes” (os “Balés Russos”) foi uma
famosa companhia russa de balé que se apresentou em Paris e outras capitais
culturais entre 1909 e 1920, sob a direção de Sergei Diaghilev. A companhia
combinava a dança, a música e as artes visuais de formas notavelmente
inovadores e influentes. Depois que a companhia se dissolveu, foi sucedida por
duas ramificações concorrentes: o “Ballet Russe de Monte Carlo” e o “Original
Ballet Russe”. A conexão entre o título atribuído ao poema e o próprio poema é
enigmática: este se compõe de uma séria de orações que carecem de relação
aparente. Algumas delas se assemelham a autodescrições ou confissões (“Cometi
erros”), enquanto outras parecem ser afirmações gerais (“Todas as pessoas têm
sentimentos”). Desprovidas de contexto, as orações oscilam incertas entre o profundo
e o ridículo, perturbando a forma como habitualmente nos moldamos ao desempenho
e ao sentido do enunciado. (AXELROD; ROMAN; TRAVISANO, 2012, p. 403-404)
J.A.R. – H.C.
Charles Bernstein
(n. 1950)
Ballet Russe
Every person has
feeling.
It is all the same.
I will travel.
I love nature.
I love motion &
dancing.
I did not understand
God.
I have made mistakes.
Bad deeds are
terrible.
I suffered.
My wife is
frightened.
The stock exchange is
death.
I am against all
drugs.
My scalp is strong
& hard.
I like it when it is
necessary.
It is a lovely drive.
A branch is not a
root.
Handwriting is a
lovely thing.
I like tsars &
aristocrats.
An aeroplane is
useful.
One should
permanently help the poor.
My wife wants me to
go to Zurich.
Politics are death.
All young men do
silly things.
The Spaniards are
terrible people because they murder bulls.
My wife suffered a
great deal because of her mother.
I will tell the whole
truth.
I love Russia.
I am nasty.
I am terrified of
being locked up & losing my work.
Mental agony is a
terrible thing.
I pretend to be a
very nervous man.
(1978)
No camarim do balé:
bailarinas do Bolshoi
(Zinaida Serebryakova:
pintora russa)
Ballet Russe
Todas as pessoas têm
sentimentos.
É tudo a mesma coisa.
Vou viajar.
Amo a natureza.
Encanta-me o
movimento e a dança.
Deus não me acedeu à
compreensão.
Cometi erros.
As más ações são terríveis.
Padeci por isso.
Minha esposa está assustada.
A bolsa de valores é
a morte.
Sou contra todas as
drogas.
Meu couro cabeludo é
forte & rijo.
Gosto de algo quando se
revela necessário.
É um maravilhoso impulso.
Um ramo não é uma
raiz.
A escrita à mão tem
um quê de encantador.
Gosto de czares &
aristocratas.
Um avião é de grande
utilidade.
Deve-se ajudar
permanentemente os pobres.
Minha esposa quer que
eu vá para Zurique.
A política é a morte.
Todos os jovens fazem
coisas tolas.
Terríveis são os
espanhóis, pois matam touros.
Minha esposa sofreu
muito por causa de sua mãe.
Direi toda a verdade.
Amo a Rússia.
Sou desagradável.
Tenho pavor de ser
preso & de perder meu trabalho.
A agonia mental é uma
coisa terrível.
Finjo ser um homem
muito nervoso.
(1978)
Referência:
BERNSTEIN, Charles.
Ballet russe. In: AXELROD, Steven Gould; ROMAN, Camille; TRAVISANO, Thomas
(Eds.). The new anthology of american poetry. Vol. 3: Postmodernisms
1950-Present. New Brunswick, NJ: Rutgers University Press, 2012. p 403.
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