Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 12 de maio de 2023

Alberto Blanco - Minha Tribo

Poder-se-ia depreender destes versos do poeta mexicano uma mensagem propositiva de comunhão, de convívio fraterno e não discriminatório, não apenas entre os humanos, mas também entre estes e eventuais outros seres que possam existir pelo universo afora, de modo a ampliar de forma drástica o sentido da palavra “tribo”, até que a torne um verbete sem sentido, por a todos incluir incondicionalmente.

 

Pertencer a uma “tribo”, qualquer que seja a acepção que se tome corriqueiramente, significa, por um lado, abarcar alguns e, por outro, excluir muitos – como os imigrantes, os empobrecidos, os que pertencem a determinada origem, religião, raça, sexo, cor, idade e por aí vai: o preconceito é o viés que fundamenta a existência da grande maioria das “tribos”.

 

Sob o firmamento, a pequenina Terra, de onde o poeta espera derivar a notícia maior de um acolhimento holista, abrangedor, universalista, objetivando “recriar o paraíso agora, para o merecer quem vem depois” – como diriam os letristas Beto Guedes e Ronaldo Bastos, na bela composição “O Sal da Terra”.

 

J.A.R. – H.C.

 

Alberto Blanco

(n. 1951)

 

Mi Tribu

 

La tierra es la misma

el cielo es otro.

El cielo es el mismo

la tierra es otra. (*)

 

De lago en lago,

de bosque en bosque:

¿cuál es mi tribu?

– me pregunto –

¿cuál es mi lugar?

 

Tal vez pertenezco a la tribu

de los que no tienen tribu;

o a la tribu de las ovejas negras;

o a una tribu cuyos ancestros

vienen del futuro:

una tribu que está por llegar.

 

Pero si he de pertenecer a alguna tribu

– me digo –

que sea a una tribu grande,

que sea una tribu fuerte,

una tribu donde nada ni nadie

quede fuera de la tribu,

donde todos,

todo y siempre

tengan su santo lugar.

 

No hablo de una tribu humana.

No hablo de una tribu planetaria.

No hablo siquiera de una tribu universal.

 

Hablo de una tribu de la que no se puede hablar.

 

Una tribu que ha existido siempre

pero cuya existencia está todavía por ser comprobada.

 

Una tribu que no ha existido nunca

pero cuya existencia

podemos ahora mismo comprobar.

 

A Tribo IV: a tribo urbana

(Filipe Assunção: artista português)

 

Minha Tribo

 

A terra é a mesma

o céu é outro.

O céu é o mesmo

a terra é outra. (*)

 

De lago em lago

de bosque em bosque:

qual é minha tribo?

– me pergunto –

qual é meu lugar?

 

Talvez eu pertença à tribo

dos que não têm tribo;

ou à tribo das ovelhas negras;

ou a uma tribo cujos ancestrais vêm do futuro:

uma tribo que está por chegar.

 

Porém se hei de pertencer a alguma tribo

– me digo –

que seja uma tribo grande,

que seja uma tribo forte,

uma tribo onde ninguém

fique fora da tribo,

onde todos,

tudo e sempre

tenham seu santo lugar.

 

Não falo de uma tribo humana.

Não falo de uma tribo planetária.

Não falo sequer de uma tribo universal.

 

Falo de uma tribo da qual não se possa falar.

 

Uma tribo que sempre existiu

porém cuja existência está ainda por ser comprovada.

 

Uma tribo que não tenha jamais existido

porém cuja existência

possamos agora mesmo comprovar.

 

Nota:

 

(*). Deixo aqui assente que a primeira estrofe do poema, presente na referência alusiva à obra bilíngue (Espanhol x Inglês), abaixo mencionada, não consta na tradução ao português, elaborada por Floriano Martins, tendo sido por mim interpolada na posição que lhe corresponde. Não saberia dizer se se trata de um mote, a partir do qual o poeta desenvolveu o poema, ou mesmo – quem sabe? – a replicação de alguma ideia consignada alhures, de sua autoria ou de outrem.

 

Referências:

 

Em Espanhol

 

BLANCO, Alberto. Mi tribu. In: __________. Dawn of the senses: selected poems of Alberto Blanco. Edited by Juvenal Acosta. Introduction by José Emilio Pacheco. A bilingual edition: Spanish x English. Various translators. San Francisco, CA: City Light Books, 1995. p. 2 y 4. (Pocket Poets Series; nº 52)

 

Em Português

 

BLANCO, Alberto. Minha tribo. Tradução de Floriano Martins. In: LANGAGNE, Eduardo (Organização e Estudo Introdutório). Dentro do poema: poetas mexicanos nascidos entre 1950 e 1959. Tradução de Floriano Martins. Coedição com a Secretaria de Cultura do Estado do Ceará - Secult. Fortaleza, CE: Edições UFC, 2009. p. 113. (Coleção Nossa Cultura, n. 1; Série Bolivariana, n. 3)

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