O poeta inglês vê na
poesia algo de insubsistente – melhor seria dizer inconsistente –, quando ela
se apropria da História para alcançar proveitos próprios, em vez de se orientar
por caminhos capazes de cumprir os deveres que lhe são privativos: uma poesia
que não se autoexamina, pejada de palavras carentes do fervor pentecostal, como
cinzas do que se exauriu para sempre.
A exumação dos mortos
revela que estes foram atingidos por “atrocidades da língua”, passando a
ostentar “feridas azuis”: na hipótese de se volver à tradição, como forma de
“saudação” ou de reverência, não se deve enveredar por adulações exageradas,
senão por uma revelação restaurada da palavra, responsável diante do legado da
História, vívida contudo, como o dom radioso das línguas de fogo de
Pentecostes!
J.A.R. – H.C.
Geoffrey Hill
(1932-2016)
History as Poetry
Poetry as salutation;
taste
Of Pentecost’s ashen feast.
Blue wounds.
The tongue’s
atrocities. Poetry
Unearths from among
the speechless dead
Lazarus mystified,
common man
Of death. The lily
rears its gouged face
From the provided
loam. Fortunate
Auguries; whirrings;
tarred golden dung:
‘A resurgence’ as
they say. The old
Laurels wagging with
the new: Selah!
Thus laudable the
trodden bone thus
Unanswerable the
knack of tongues.
A ressurreição de
Lázaro
(ao modo de
Rembrandt)
(Vincent van Gogh:
pintor holandês)
A História como
Poesia
A poesia como
saudação; sabor
De celebração das
cinzas de Pentecostes. Feridas azuis.
As atrocidades da
língua. A poesia
exuma de entre os
mortos sem fala
O mistificado Lázaro,
o homem naturalmente
Mortal. O lírio ergue
sua face lavrada
A partir da marga
provida. Afortunados
Augúrios; sibilantes;
estrume dourado alcatroado:
‘Uma ressurgência’,
como se diz. Os velhos
Lauréis a menear com
os novos: Selah!
Assim louvável o osso
pisoteado; assim
Incontestável o dom
das línguas.
Referência:
HILL, Geoffrey. History
as poetry. In: __________. New and collected poems: 1952-1992. 1st ed.
New York, NY: Mariner Books (Houghton Mifflin Company), 2000. p. 72.
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