Num vale que teria
presenciado embates marciais, com perda apreciável de vidas humanas, jazem as
almas dos mortos numa espécie de campo santo, pendentes de acolhida na quietude
da eternidade, contexto de onde se colige certa paisagem imaginativa
assombradora – típica dos elementos soturnos e misteriosos que bem caracterizam
as criações de Poe.
Presenças
sobrenaturais movimentariam as árvores no lugar – não o vento, como seria
presumível –, idem as nuvens que flutuam sobre as violetas por todo o cemitério,
ou mesmo os lírios em movimento ondulante, de onde pendem gotas de orvalho – lhana
metáfora para as lágrimas vertidas pelos falecidos –, em gemas brilhantes sobre
as quais cintilam os reflexos do sol nascente.
J.A.R. – H.C.
Edgar Allan Poe
(1809-1849)
The Valley of Unrest
Once it smiled a
silent dell
Where the people did
not dwell;
They had gone unto
the wars,
Trusting to the
mild-eyed stars,
Nightly, from their
azure towers,
To keep watch above
the flowers,
In the midst of which
all day
The red sun-light
lazily lay.
Now each visitor shall
confess
The sad valley’s
restlessness.
Nothing there is
motionless –
Nothing save the airs
that brood
Over the magic
solitude.
Ah, by no wind are
stirred those trees
That palpitate like
the chill seas
Around the misty
Hebrides!
Ah, by no wind those
clouds are driven
That rustle through
the unquiet Heaven
Uneasily, from morn
till even,
Over the violets
there that lie
In myriad types of
the human eye –
Over the lilies there
that wave
And weep above a
nameless grave!
They wave: – from out
their fragrant tops
External dews come
down in drops.
They weep: – from off
their delicate stems
Perennial tears
descend in gems.
O Vale da Inquietude
(Edmund Dulac:
ilustrador franco-inglês)
O Vale da Inquietude
Dantes, silente vale
sorria.
Era um vale onde
ninguém vivia.
Haviam todos partido
em guerra,
deixando os doces
olhos de estrelas
noturnamente velarem
pelas
flores formosas
daquela terra,
em cujos braços, dia
após dia,
a luz vermelha do sol
dormia.
Não há viajante que, hoje,
não fale
sobre a inquietude do
triste vale.
Lá, agora, tudo é só
movimento,
exceto os ares,
pesando, adustos,
nas soledades de
encantamento.
Ah! nenhum vento move
os arbustos
que vibram como as
ondas geladas
em torno às Hébridas enevoadas!
Ah! nenhum vento
essas nuvens guia,
murmurejantes, nos
céus insanos,
e que se arrastam,
por todo o dia,
sobre violetas, que
alguém diria
serem milhares de
olhos humanos,
e sobre lírios, de
haste pendida,
chorando em tumba desconhecida,
tremendo; e sempre
caem, com o perfume,
gotas de orvalho do
flóreo cume,
chorando; e desce,
nas hastes frias,
um pranto eterno de
pedrarias.
Referências:
Em Inglês
POE, Edgar Allan. The
valley of unrest. In: __________. The portable Edgar Allan Poe. Edited
with an Introduction by J. Gerald Kennedy. 1st publ. New York, NY: Penguin
Books, 2006. p. 414.
Em Português
POE, Edgar Allan. O
vale da inquietude. Tradução de Oscar Mendes e Milton Amado. In: __________. Poemas
e ensaios. Tradução de Oscar Mendes e Milton Amado. Revisão e notas de
Carmen Vera Cirne Lima. 2. ed. Rio de Janeiro, RJ: Globo, 1987. p. 59-60.
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