Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 26 de março de 2023

Rodrigo Pesántez Rodas - Autorretrato

Em forma de poema, o poeta equatoriano traça o seu autorretrato, deveras burlesco, com pretensões que vão bem além (ou até mesmo num sentido diverso), em relação ao comum entendimento que se possa ter quanto ao que diga ou ao que, em grandes linhas, descreva como sendo os seus próprios traços físicos.

 

A voz lírica não se abstém de fazer referências aos seus insucessos – metafóricos “naufrágios” e dívidas –, pois assim traça um perfil mais autêntico do que espera ser melhor percebido pelos pares, no que tange à sua forma de ser: muito mais nuançada do que é capaz de se mostrar por sua estampa imediata.

 

J.A.R. – H.C.

 

Rodrigo Pesántez Rodas

(1937-2020)

 

Autorretrato

 

Este flaco Rodrigo desprovisto

de neurastenia,

callos

y virtudes,

dice cosas absurdas que no entienden

los señores que editan las palabras.

 

Por ejemplo,

si dice: “libro viejo”,

no es que al libro le nombra,

es simplemente

un deseo de amar doscientos años.

 

Si agua pide,

no es porque tenga sed,

es porque quiere

acostumbrarle al mar a sus naufragios.

 

Y cuando dice: “yo”,

no es que se ha visto,

simplemente ha sentido un trozo de hambre

y un hueso

y una deuda

en el bolsillo.

 

En: “Los silencios del bosque” (2001)

 

Homem junto ao mar

(Frank Föckler: artista alemão)

 

Autorretrato

 

Este magricela Rodrigo, desprovido

de neurastenia,

calos

e virtudes,

diz coisas absurdas que os senhores

que editam as palavras não entendem.

 

Por exemplo,

se diz: “livro velho”,

não é que pretenda nomear o livro;

é simplesmente

um desejo de amar duzentos anos.

 

Se pede água,

não é porque tenha sede;

é porque quer

acostumar o mar aos seus naufrágios.

 

E quando diz: “eu”,

não é que esteja a se olhar;

simplesmente sentiu um pouco de fome

e um osso

e uma dívida

em seu bolso.

 

Em: “Os silêncios do bosque” (2001)

 

Referência:

 

RODAS, Rodrigo Pesántez. Autorretrato. COCO, Emilio (Cur./Trad.). Il fiore della poesia latinoamericana d’oggi. Secondo volume: America meridionale I. Edizione trilingue: spagnolo / portoghese x italiano. Rimini, IT: Raffaelli Editore, 2012. p. 26. (Collana ‘Poesia presente’; v. 7)

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