O poeta é o tema
deste soneto do mestre simbolista, dirigido quer a um autor qualquer que se
dedique ao fazer poético, quer ao próprio falante: às voltas com essa “loucura
suprema” – que é a poesia –, vê-se ele enredado em sua “assinalada” missão, algemado
a um mundo que lhe parece uma espécie de prisão.
Mas é dessa desventura
que rebentam “estrelas de ternura”, belezas d’alma dos quais este mundo se mostra desprovido: não as misérias e amarguras que assolam a comum gente,
senão o belo eterno que se deduz de uma natureza “prodigiosa e rica”! Vai
poeta, segue a perseguir “os teus espasmos imortais de louco!”
J.A.R. – H.C.
Cruz e Sousa
(1861-1898)
O Assinalado
Tu és o louco da
imortal loucura,
o louco da loucura
mais suprema.
A Terra é sempre a
tua negra algema,
Prende-te nela a extrema
Desventura.
Mas essa mesma algema
de amargura,
mas essa mesma
Desventura extrema
faz que tu’alma
suplicando gema
e rebente em estrelas
de ternura.
Tu és o Poeta, o
grande Assinalado
que povoas o mundo
despovoado,
de belezas eternas,
pouco a pouco...
Na Natureza
prodigiosa e rica
toda a audácia dos
nervos justifica
os teus espasmos
imortais de louco!
Retrato do poeta
Peter Hille
(Lovis Corinth:
pintor alemão)
Referência:
SOUSA, Cruz e. O
assinalado. In: BARBOSA, Frederico. Cinco séculos de poesia: antologia
da poesia clássica brasileira. 4. ed. São Paulo, SP: Aquariana, 2011. p. 296.
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