Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 14 de março de 2023

Norman MacCaig - Sons do Dia

O poeta explora o efeito que a perda e a separação têm sobre nós, tanto a desconcertante dor de início, quanto aquelas repercussões de curso mais duradouro: quando os sons do cotidiano deixam de existir, é porque a porta se fechou de vez com um rangido, sobrevindo, então, um silêncio opressivo, um “choque de água gelada”, seguido por um estado de dormência.

 

Mais que a metafórica perda sensorial auditiva, o ente lírico expressa o quase “sem-sentido” de uma natureza a “verbalizar” com prodigalidade a sua linguagem – a dos cavalos, pássaros, ondas, cascatas –, porquanto, desde um certo dia – não um dia qualquer! –, cerrada a alma num sufocante enxame de emoções, o código que passou a contrapô-la deixou-se impregnar por uma impactante letargia.

 

J.A.R. – H.C.

 

Norman MacCaig

(1910-1996)

 

Sounds of the Day

 

When a clatter came,

it was horses crossing the ford.

When the air creaked, it was

a lapwing seeing us off the premises

of its private marsh. A snuffling puff

ten yards from the boat was the tide blocking and

unblocking a hole in a rock.

When the black drums rolled, it was water

falling sixty feet into itself.

 

When the door

scraped shut, it was the end

of all the sounds there are.

 

You left me

beside the quietest fire in the world.

 

I thought I was hurt in my pride only,

forgetting that,

when you plunge your hand in freezing water,

you feel

a bangle of ice round your wrist

before the whole hand goes numb.

 

Ondas batendo nas rochas

(Althea Dianne Nutt: pintora norte-americana)

 

Sons do Dia

 

Quando se ouviu um tropel,

eram cavalos atravessando o vau.

Quando o ar se pôs a crepitar, era

um abibe nos vendo fora do recinto

de seu pântano particular. Um sopro a chirriar

a dez jardas do barco era a maré tapando

e destapando uma fenda numa rocha.

Quando os tambores negros rolaram, era a água

a sessenta pés caindo sobre si mesma.

 

Quando a porta

se fechou com um rangido, foi o fim

de todos os sons existentes.

 

Deixaste-me

junto ao fogo mais silencioso do mundo.

 

Pensei que apenas estava ferido em meu orgulho,

esquecendo que,

quando se imerge a mão na água gelada,

logo se sente

um bracelete de gelo ao redor do pulso,

antes que toda a mão fique dormente.

 

Referência:

 

MACCAIG, Norman. Sounds of the day. The well rising. In: HEANEY, Seamus; HUGHES, Ted (Eds.). The rattle bag. 1st publ. London, EN: Faber and Faber, 1982. p. 404.

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