Justos, para Borges,
seriam os que, conforme Voltaire (1694-1778), cultivassem o próprio jardim, bem
assim todos quantos descritos, em seus atos ou formas de ser, nos versos deste
poema, os quais se equilibram no reino do desconhecido, mas que, por suas
deliberações, gratulações e blandícia, “estão salvando o mundo”.
A música, a pintura,
a literatura – poema e prosa –, a origem e a evolução das palavras, tudo quanto
esteja no domínio do espírito criador e do desvelamento: tais são os recursos
para que possamos transformar o mundo num território “concertado”, uma
província do digno, do equânime, do oportuno, do virtuoso, do venturoso.
J.A.R. – H.C.
Jorge Luis Borges
(1899-1986)
Los justos
Un hombre que cultiva
su jardín, como quería Voltaire.
El que agradece que
en la tierra haya música.
El que descubre con
placer una etimología.
Dos empleados que en
un café del Sur juegan un silencioso ajedrez.
El ceramista que
premedita un color y una forma.
El tipógrafo que
compone bien esta página, que tal vez no le agrada.
Una mujer y un hombre
que leen los tercetos finales de cierto canto.
El que acaricia a un
animal dormido.
El que justifica o
quiere justificar un mal que le han hecho.
El que agradece que
en la tierra haya Stevenson.
El que prefiere que
los otros tengan razón.
Esas personas, que se
ignoran, están salvando el mundo.
En: “La cifra” (1981)
Os justos levados ao
céu (detalhe)
(Michelangelo
Buonarroti: artista italiano)
Os justos
Um homem que cultiva
seu jardim, como queria Voltaire.
O que agradece que na
terra exista música.
O que descobre com
prazer uma etimologia.
Dois empregados que
em um café do Sur jogam um silencioso xadrez.
O ceramista que
premedita uma cor e uma forma.
O tipógrafo que
compõe bem esta página, que talvez não lhe agrade.
Uma mulher e um homem
que leem os tercetos finais de certo canto.
O que afaga um animal
adormecido.
O que justifica ou
quer justificar um mal que lhe fizeram.
O que agradece que na
terra exista Stevenson.
O que prefere que os
outros estejam certos.
Essas pessoas, que se
desconhecem, estão salvando o mundo.
Em: “A cifra” (1981)
Referência:
BORGES, Jorge Luis.
Los justos / Os justos. Tradução de Josely Vianna Baptista. In: __________. Poesia.
Tradução de Josely Vianna Baptista. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2009. Em
espanhol: p. 600; em português: p. 346. (Biblioteca ‘Borges’)
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