Numa elocução com
tonalidades hieráticas, Murilo discorre sobre o “poeta futuro”, que já se
encontraria em nosso meio, com espírito depurado, sereno, resultado da “síntese
de todas as raças”, emergindo de veios epocais carregados de “luta” e de “negação”,
para escrever “poemas consoladores” e indicar o caminho do “inferno” aos que
promovem a guerra e “asfixiam órfãos e operários”.
Frente a esse olhar
sobre o que deixará de ser e o que sobrevirá como padrão corrente, o poeta torna-se
o arauto de um novo tempo, de virtude, paz e sabedoria, iluminado pelo sol
interior; quase um sacerdote a manifestar a presença do sagrado em todas as coisas,
cumprindo-lhe desvelar aos homens o sentido último do que seja o amor.
J.A.R. – H.C.
Murilo Mendes
(1901-1975)
O poeta futuro
O poeta futuro já se
encontra no meio de vós.
Ele nasceu da terra
Preparada por
gerações de sensuais e de místicos:
Surgiu do universo em
crise, do massacre entre irmãos,
Encerrando no
espírito épocas superpostas.
O homem sereno, a
síntese de todas as raças,
o portador a vida
Sai de tanta luta e
negação, e do sangue espremido.
O poeta futuro já
vive no meio de vós
E não o pressentis.
Ele manifesta o
equilíbrio de múltiplas direções
E não permitirá que
algo se perca,
Não acabará de apagar
o pavio que ainda fumega,
Transformando o aço
de sua espada
Em penas que
escreverão poemas consoladores.
O poeta futuro
apontará o inferno
Aos geradores de
guerra,
Aos que asfixiam
órfãos e operários.
Em: “Metamorfoses”
(1944)
O livro do poeta
(Miroslaw J. Kin: artista
polonês)
Referência:
MENDES, Murilo. O poeta futuro. In: BRASIL, Assis (Organização, Introdução e Notas). A poesia mineira no século XX: antologia. Rio de Janeiro, RJ: Imago, 1998. p. 47. (Coleção ‘Poesia Brasileira’)
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