Mais ou menos a meio
da década de 60 do século passado, mais exatamente entre abril de 1965 e maio
de 1967, o epigrafado poeta e jornalista maranhense esteve em Lisboa (PT), como
adido cultural à Embaixada do Brasil naquela cidade, tempo suficiente para
conhecer e passar a amar os encantos que a capital portuguesa oferece aos seus
residentes e turistas.
O poema a seguir é um
dos que compõem o poemário “Tempo de Lisboa e Outros poemas” (1966), uma
declaração de amor a Lisboa, a célebre urbe entrecortada pelo estuário do Tejo,
margeada tal-qualmente pelo vasto e convidativo oceano à frente, a evocar o seu
próprio e jungido “mar de histórias”, suporte fundante para quem, ciente de seu
passado, lança-se a um intrépido futuro – que se espera ainda mais ilustre.
J.A.R. – H.C.
Odylo Costa, filho
(1914-1979)
Declaração de amor à
cidade de Lisboa
À maneira e em
memória
de António Nobre
Lisboa dos gerânios
na sacada,
ter a alma por tuas
flores arrancada,
das suas dores fundas
esfregada,
ficar leve e
branquinha de lavada,
de sol e não de
lágrimas lavada...
Ó Lisboa das flores
pelo chão,
ervas e flores, rio e
coração,
Lisboa de Garrett e
João de Deus,
em tuas mãos ponho os
destinos meus.
Nasço de novo em ti.
Abre-se em rosa
a rocha malferida e
dolorosa.
Ó Lisboa de touro e
cal, de tinta suave,
de janela de pedra
(voo de ave),
cidade de colina e
ponte, cria
na vã saudade a
súbita alegria.
Põe nesta ausência, à
força de paisagem
e de canção, as
salvações da viagem.
Não podes ressurgir
os corpos perecidos
mas podes devolver-me
os sonhos já perdidos.
Ó Lisboa das naus,
que o poeta amou outrora,
dá-me para beber
consolações de agora.
Faz-me um vinho perfeito,
decantado,
nas noites longamente
preparado,
Sem gosto à terra nem
às pedras do lagar, (*)
onde o Senhor possa o
deu pão molhar.
Lisboa, abril de 1965
Em: “Tempo de Lisboa
e Outros poemas” (1966)
Vista panorâmica de
Alfama
(Elena Petrova
Gancheva: artista búlgara)
Nota:
(*). Lagar: nome pelo qual se designam as oficinas dotadas de aparelhos
adequados para espremer certos frutos (uva, azeitona), reduzindo-os a líquido,
ou mesmo os tanques em que, nessas oficinas, são espremidos os frutos.
Referência:
COSTA FILHO, Odylo. Declaração
de amor à cidade de Lisboa. In: __________. Poesia completa. Edição
preparada por Virgílio Costa, com colaboração do Instituto Odylo Costa, filho.
Rio de Janeiro, RJ: Aeroplano; Fundação Biblioteca Nacional, 2010. p. 482-483.
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