O motivo para se
escrever poesias bem pode ser a própria poesia, os poetas, suas contingências de
vida: é exatamente isso que empreende o autor carioca, neste soneto alexandrino
sem esquema definido de rimas, no qual há menção a nove poetas, sendo apenas um
deles brasileiro – nomeadamente, Augusto dos Anjos.
Há, decerto – poderia
arguir o leitor – alguma intenção encomiável nestes versos de Uchôa, refletida
na escolha de nomes marcantes da lírica universal, cujas obras mantêm-se ainda firmes
no horizonte da poética, como polos de influência para novos autores, incitando-lhes
à criação, para que possam resgatar da mixórdia, da indistinção, da trivialidade,
de todo o marasmo, preciosas pérolas que jazem insuspeitas no fundo do mar do quotidiano.
J.A.R. – H.C.
O Bote dos Poetas
(Donald Langosy:
artista norte-americano)
Motivo de Poesia
Rabindranath desmonta
o tempo de Anabel,
onde Poe ressuscita auroras
de lirismo,
“e os espíritos maus
da noite morta riam”
na sombra encarcerada
e fria de Oscar Wilde.
Que é que Mallarmé
prepara nas palavras
se não a poesia
sempre trabalhada
“Este encanto criou
corpo e alma e dispersou”
a luz prostrada nas vigílias
de Rimbaud.
É certa a anunciação
da amada e espera Rilke
que seu jogo de amar
amante se recante
sem que Augusto dos
Anjos entorne o ouro amargo.
A brisa recompõe as
tendas de Garcia
Lorca, e já no
dealbar retoma Maiacovsky
deixando uma canção à
margem dos trigais.
Encontro de dois
poetas num jardim à noite
(Donald Langosy:
artista norte-americano)
Referência:
UCHÔA, Fernando
Jorge. Motivo de poesia. In: __________. Alvorada inquieta. São Paulo,
SP: Editora do Escritor; Luz e Silva Editor, 1986. p. 14.
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