Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 18 de julho de 2022

Charles Simic - Errata

Este inusitado poema centra-se nas possibilidades poéticas das listas de erratas, comumente empregadas em obras literárias e científicas para impor bom termo às suas redações. Com efeito, nas anáforas manejadas pelo poeta percebe-se a busca de cambiar diversos símbolos por outros que se lhes equivalham e que façam mais sentido aos destinatários da mensagem.

 

São transformadas de conteúdo para capturar o significado último de um mito, de uma legenda, de uma metáfora, de uma tradição, embrenhando-se mais além do que a própria linguagem, com o fito de desvelar liames primordiais em nossas experiências, aquelas coisas que percutem renitentemente aos ouvidos, sem que nos obstinemos em convertê-las em palavras grafadas nos tomos.

 

J.A.R. – H.C.

 

Charles Simic

(n. 1938)

 

Errata

 

Where it says snow

read teeth marks of a virgin

Where it says knife read

you passed through my bones

like a police whistle

Where it says table read horse

Where it says horse read my migrant’s bundle

Apples are to remain apples

Each time a hat appears

think of Isaac Newton

reading the Old Testament

Remove all periods

They are scars made by words

I couldn’t bring myself to say

Put a finger over each sunrise

it will blind you otherwise

That damn ant is still stirring

Will there be time left to list

all errors to replace

all hands guns owls plates

all cigars ponds woods and reach

that beer bottle my greatest mistake

the word I allowed to be written

when I should have shouted

her name

 

Skylands

(Rob Schouten: artista holandês)

 

Errata

 

Onde está neve

leia marcas de dentes de uma virgem

Onde está faca leia

você transpassou meus ossos

como um apito de polícia

Onde está mesa leia cavalo

Onde está cavalo leia minha trouxa de migrante

Maçãs devem continuar maçãs

Cada vez que surge um chapéu

pense em Isaac Newton

lendo o Velho Testamento

Elimine todos os períodos

Eles são cicatrizes feitas de palavras

que não me atrevi a dizer

Meta um dedo em cada aurora

do contrário ela o cegará

A maldita formiga ainda se mexe

Há de haver o tempo certo para listar

todos os erros para substituir

todas as mãos armas corujas pratos

todos os charutos poças paus e alcançar

aquela garrafa de cerveja meu maior engano

a palavra que deixei ser escrita

quando devia ter gritado

o nome dela

 

Referência:

 

SIMIC, Charles. Errata / Errata. Tradução de Fabio Weintraub e Ricardo Rizzo. Cacto: poesia & crítica, São Paulo (SP), n. 3, p. 80-81, primavera 2003. Em inglês: p. 80; em português: p. 81.

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