Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 5 de julho de 2022

Guilherme de Campos - Confidência

Com algumas manobras no fluxo textual, provocadas por hipérbatos e mesmo por formas verbais pouco empregadas, o poeta nos confidencia que os poemas que redige são “sobras de ser ele poesia em si próprio”, um estado decantado de palavras a denotar suas intuições prévias, tal que as linhas gravadas no papel possam antever coisas ainda não materializadas, como musgos verde-mar.

 

Os poemas, se assumem formas claras, tornam as evidências deles hauridas um afadigar-se sem propósitos mais elevados; se obscuros, faltam-lhes a maturação necessária para as descobertas: o poeta, feito um anjo, planando às soltas sobre o terreno da labuta literária, busca tanger tudo quanto intocado, sem antecipar debalde os gestos inaugurais que presidem o poema.

 

J.A.R. – H.C.

 

Cais de Rouen

(Camile Pissaro: pintor francês)

 

Confidência

 

O poema onde a intuição musgos descobre

não sidos

Os que são claros poemas me afadigam

de evidências

Obscuros os poemas que são em si

imaturos para as descobertas

Os que deixam no rumo dos trilhos

as tangentes das distâncias

E os que não ousam sequer tocar

as presenças intatas

E os que são puras antecipações

dos gestos inaugurais

 

O musgo verde-mar cinge a fronte do Anjo

que preside à Poesia não sida

 

Meu poema é o que sobra de eu ser

Poesia em mim

 

Carruagens Ferroviárias

(Vincent van Gogh: pintor holandês)

 

Referência:

 

CAMPOS, Guilherme de. Confidência. In: __________. A procura do autêntico. Rio de Janeiro: Livraria São José, dez. 1958. p. 124.

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