Bem ao estilo
expressionista, os versos de Trakl arrimam, nas imagens suscitadas, ênfase no susto
ou no sobressalto, diante de uma paisagem urbana pesarosa, apta a “destilar” os
seus “venenos sombrios”, ou por equivalência, não exatamente um cenário pacífico
para um sono reparador, senão de forças sinistras a colonizar um pesadelo.
O falante interage
com o seu sono, descrevendo um sonho nele inserto, a transcorrer de noite num estranho
jardim, cheio de animais apavorantes – serpentes, aranhas, morcegos, falenas –,
quando então surge um forasteiro, um “sinistro corsário”, e sua sombra aumenta
a “tribulação”. A epilogar o poema, pássaros brancos em fundo negro dão um
contorno incisivo a essa tela citadina crispada pelo aço.
J.A.R. – H.C.
Georg Trakl
(1887-1914)
Der Schlaf
Verflucht ihr dunklen
Gifte,
Weißer Schlaf!
Dieser höchst
seltsame Garten
Dämmernder Bäume
Erfüllt von
Schlangen, Nachtfaltern,
Spinnen,
Fledermäusen.
Fremdling! Dein
verlorner Schatten
Im Abendrot,
Ein finsterer Korsar
Im salzigen Meer der
Trübsal.
Aufflattern weiße
Vögel am Nachtsaum
Über stürzenden
Städten
Von Stahl.
Sono
(Raphaël Collin:
pintor francês)
O Sono
Amaldiçoados, veneno
escuro,
Sono branco!
Este jardim
estranhíssimo
De árvores
entardecentes
Fartas de serpentes,
falenas,
Aranhas, morcegos.
Forasteiro! Tua
sombra perdida
No crepúsculo,
Um obscuro corsário
No mar salgado da
tribulação.
Esvoaçam pássaros
brancos na aba da noite
Sobre cadentes
cidades
De aço.
Referência:
TRAKL, Georg. Der schlaf / O sono. Tradução de André Valias. Cacto: poesia & crítica, São Paulo (SP), n. 4, p. 87, primavera 2004. Em alemão e em português: p. 87.
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