Passados quatro anos
de um relacionamento que findou com o passamento do companheiro da falante,
mesmo que esta tenha se desfeito de tudo que a levasse a memorar o já distante consorte,
resta-lhe a impressão de que sempre há algo dele suspenso nos interstícios de
sua residência, até mesmo no pó que se encosta à mobília, levando-a a crer que,
ocasionalmente, está a tocar vestígios de sua pele.
Não resta
suficientemente exato se, no interno da voz lírica, há um sentimento de
gratidão ou de reconhecimento em relação ao transcorrido convívio matrimonial,
muito embora o fluxo das linhas do poema firme a hipótese, aqui como ali, de haver
uma necessidade premente de se suprimir qualquer elemento que a lembre da
relação havida.
Ou por outra: os versos
sugerem haver indícios da presença do falecido, primeiramente, na mente da falante,
os quais acabam por se converter nessa quase obsessão em sua manifestação
física.
J.A.R. – H.C.
Pamela Gillilan
(1918-2001)
Four Years
The smell of him went
soon
from all his shirts.
I sent them for
jumble,
and the sweaters and
suits.
The shoes
held more of him; he
was printed
into his shoes. I did
not burn
or throw or give them
away.
Time has denatured
them now.
Nothing left.
There will never be
a hair of his in a
comb.
But I want to believe
that in the shifting
housedust
minute presences
still drift:
an eyelash,
a hard crescent cut
from a fingernail,
that sometimes
between the folds of
a curtain
or the covers of a
book
I touch
a flake of his skin.
Depois do baile de
máscaras
(Greg Olsen: artista
norte-americano)
Quatro Anos
O cheiro dele logo
desapareceu
de todas as suas
camisas.
Lancei-as num
emaranhado,
e os suéteres e ternos.
Os calçados
o retiveram mais: ele
ficou gravado
em seus sapatos. Não
os queimei,
nem os atirei fora ou
os doei.
O tempo agora os
desnaturou.
Não restou nada.
Nunca haverá sequer
um cabelo seu num
pente.
Porém quero crer
que no cambiante pó
da casa
ainda há presenças
diminutas à deriva:
uma pestana,
uma rija meia-lua
cortada a uma unha da mão,
a ponto de, às vezes,
entre as dobras de
uma cortina
ou as capas de um
livro,
eu tocar
numa lâmina de sua
pele.
Referência:
GILLILAN, Pamela.
Four years. In: ASTLEY, Neil (Ed.). Staying alive: real poems for unreal
times. 1st. ed. New York, NY: Miramax Books, 2003. p. 387-388.
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