Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 1 de junho de 2022

Sylvia Plath - Cruzando as Águas

Neste emblemático poema, há certo contraste entre o cenário de escuridão de alguns versos com outros a revelar súbita cintilação de firmamento: no plano onírico de que se revestem as linhas de Plath, cruzar as águas sugere uma transmutação entre o tangível e o etéreo, entre o império do telúrico e os alvores do numinoso.

 

À medida que se penetra no texto, percebem-se as imagens devaneantes suscitadas quer pela aparência do que se encontra à superfície, quer – e talvez mais importante – do que prevalece em suas profundezas, até que se chegue ao remate, quando todo o simbolismo se esclarece pelo silêncio de duas almas perplexas em transição para outro reino.

 

J.A.R. – H.C.

 

Sylvia Plath

(1932-1963)

 

Crossing the Water

 

Black lake, black boat, two black, cut-paper people.

Where do the black trees go that drink here?

Their shadows must cover Canada.

 

A little light is filtering from the water flowers.

Their leaves do not wish us to hurry:

They are round and flat and full of dark advice.

 

Cold worlds shake from the oar.

The spirit of blackness is in us, it is in the fishes.

A snag is lifting a valedictory, pale hand;

 

Stars open among the lilies.

Are you not blinded by such expressionless sirens?

This is the silence of astounded souls.

 

Cruzando o Rio Volga

perto de Stalingrado em 1942

(Vasiliy Strigin: pintor russo)

 

Cruzando as Águas

 

Lago negro, barco negro, duas silhuetas negras de papel

recortado.

Aonde vão as árvores negras que aqui dessedentam?

Suas sombras devem cobrir o Canadá.

 

Um pouco de luz se filtra através das flores aquáticas.

Suas folhas não desejam que nos apressemos:

São redondas e planas e cheias de conselhos obscuros.

 

Gélidos mundos se agitam sob o efeito do remo.

O espírito das trevas está em nós, está nos peixes.

Um tronco submerso ergue uma pálida mão em despedida;

 

Estrelas se abrem entre os lírios.

Não estás cego por sereias tão inexpressivas?

Este é o silêncio das almas atônitas.

 

Referência:

 

PLATH, Sylvia. Crossing the water. In: HEANEY, Seamus; HUGHES, Ted (Eds.). The rattle bag. 1st publ. London, EN: Faber and Faber, 1982. p. 117-118.

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