Esta “canção de sonho”
– a de nº 157 – vai dedicada a um amigo do poeta, músico decerto, que faleceu não
faz muito e para quem foram redigidas, ao todo, dez canções: tudo são desejos
que a voz lírica emite em relação ao amigo, famoso em vida, mas cuja obra já se
mostra evanescente, pelos drásticos efeitos do tempo.
As palavras e as imagens
evocadas por Berryman associam-se menos a um mundo de ventura cristã,
propriamente dita, a ser usufruída no além-vida, e bem mais a uma dita com
traços orientais, digo melhor, budistas, a ser experimentada pelo falecido
junto a grandes vultos da música clássica, de quem em vida muito se afeiçoara.
J.A.R. – H.C.
John Berryman
(1914-1972)
From ‘Dream Songs’ (157)
Ten Songs, one solid
block of agony,
I wrote for him, and
then I wrote no more.
His sad ghost must
aspire
free of my love to
its own post, that ghost,
among its fellows, Mozart’s,
Bach’s, Delmore’s
free of its careful
body
high in the shades
which line that avenue
where I will gladly
walk, beloved of one,
and listen to the
Buddha.
His work downhill, I
don’t conceal from you,
ran and ran out. The
brain shook as if stunned,
I hope he’s over
that,
flame may his glory
in that other place,
for he was fond of
fame, devoted to it,
and every first-rate
soul
has sacrifices which
it puts in play,
I hope he’s sitting
with his peers: sit, sit,
& recover and be
whole.
Música
(Thomas Eakins:
pintor norte-americano)
De ‘Canções de Sonho’
(157)
Dez Canções, um
sólido bloco agônico,
escrevi para ele, e
depois já não mais escrevi.
Seu triste espectro
deve aspirar
livre do meu amor ao seu
próprio posto, esse assombro,
entre os vultos de
seus confrades – Mozart, Bach, Delmore –,
livre de seu zeloso
corpo,
no alto das sombras que
bordejam tal avenida
por onde caminharei ditosamente,
amado junto ao Uno,
e a escutar o Buda.
A sua obra ladeira
abaixo, sem que lha disfarce,
apressurou-se e se esgotou.
O cérebro fremiu como
se estivesse aturdido:
espero que tenha
superado essa comoção.
Que a sua glória
fulgure nesse outro lugar,
pois era aficionado à
fama, devotado a ela,
e toda alma de primeira
classe
tem sacrifícios que põe
em jogo.
Estimo que esteja
sentado com seus pares: sente-se,
sente-se, recupere-se
e alcance a plenitude.
Referência:
BERRYMAN, John. From
‘dream songs’ (157). In: ASTLEY, Neil (Ed.). Staying alive: real poems
for unreal times. 1st. ed. New York, NY: Miramax Books, 2003. p. 67.
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