Sem conseguir em parte
alguma a escrita original deste poema, em espanhol, redigido pela escritora e
professora argentina, trago-o assim, tão somente, na forma em que traduzido ao
nosso idioma, por João Moura Jr.: a voz lírica deduz situações da mais que discorrida
metáfora de um Adão nu em suas andanças pelo Éden, no Gênese, em conexão com o
que seria de se esperar de homens contemporâneos deslocados no tempo por mais
de dois mil anos.
Trata-se de uma
leitura factível (e por que não dizer poética?!) do texto bíblico – vá lá,
sejamos transigentes (rs) –, afinal, qualquer um que abraçasse o “minimalismo”,
veria aqui uma mensagem que lhe seria conforme: o “paraíso” como conjuntura a
prescindir de toda “pompa e circunstância”, sem se inflar o “ego” presunçosamente,
como os homens da Justiça, da Igreja, da Política e da Ciência – ou mesmo os
mais comuns dos mortais – o fazem corriqueiramente, para apregoarem uma (auto)importância
que, muitas vezes, a bem da verdade, deveras se lhes pode atribuir.
J.A.R. – H.C.
Sara Zapata Valeije
(1938-2018)
O paraíso
Da leitura do Gênese
se infere
que Adão, nosso
primeiro pai
não usava toga ministerial
ou acadêmica
manto de rei ou anel
de bispo
não trazia tampouco
jarreteiras ou barrete
nem gravata cinza
para as reuniões de diretório
nem guarda-pó de
físico nuclear
nem lapela para o
distintivo do partido
nem uniforme de
hippie ou de boêmio
e sua excentricidade
era tão extrema
que tampouco queria
usar calças;
acho que deveria
reler o Gênese
pois as letras
sagradas sempre ensinam algo
Folhetim, 12.12.84
Adão: estudo para ‘O
Paraíso Perdido’
(Alexandre Cabanel:
pintor francês)
Referência:
VALEIJE, Sara Zapata.
O paraíso. Tradução de João Moura Jr. In: SUZUKI JR., Matinas; ASCHER, Nelson
(Organizadores). Folhetim: poemas traduzidos. São Paulo, SP: Folha de
São Paulo, 1987. p. 37.
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Linda poesia.
ResponderExcluirArthur Claro
http://www.arthur-claro.blogspot.com