As palavras de Kabir
expressam aqui a sua particular devoção à divindade do hinduísmo, que se manifesta
numa espécie de mística de amor junto à natureza, a modo de força espiritual que
de todos os lados apreende emoções por meio de símbolos e de metáforas, os
quais, a bem da verdade, mesclam crenças originárias da tradição brâmane com
outras aparentemente auferidas à metafísica islâmica.
Pouco importa se um
místico brâmane ou se sufi, o fato é que Kabir dispunha desse poder inato de aceder
a uma vida ascética e dela nos dar conta pela via de uma representação artística,
ou melhor, mediante o artesanato das palavras, da decantação de versos sublimes,
revelando-nos um modo de se contemplar a realidade divina e os seus transcendentes
mistérios.
J.A.R. – H.C.
Kabir
(1440-1518)
[7]
Ao desvelar-se,
Brahman dá a ver o invisível.
Como a semente
carrega a potência da árvore,
E a árvore traz consigo
a promessa da sombra,
Assim, Ele engendra o
incontável sem forma,
E o incontável,
miríades de formas sem conta.
Em Brahman, o ente;
no ente, Brahman:
Sempre distintos;
todavia, sempre um.
Ele: a semente, a
árvore, a sombra.
Ele: o sopro, a
palavra, o sentido.
Ele: também o que não
pode ser dito.
No interior da alma,
vejo a alma suprema.
No interior da alma
suprema, o grande ponto. (*)
No interior do grande
ponto, o reflexo.
Ó irmãos, como
expressar tal maravilha?
Kabir é abençoado por
ter esta visão!
Brahman: o Senhor da
Criação
no Hinduísmo
Nota de José Tadeu
Arantes:
(*). O “grande
ponto”, referido no verso, é o mahabindu, um conceito fundamental da
cosmogonia hinduísta. Conforme supuseram os antigos sábios, nesse ponto sem
dimensões, nesse “nada que é tudo”, para repetirmos as palavras de Fernando
Pessoa, o Absoluto, ensimesmado, preexiste a toda manifestação e relativização.
(KABIR, 2013, p. 147)
Referência:
KABIR. Poema nº 7: Ao
desvelar-se, Brahman dá a ver o invisível. Tradução de José Tadeu Arantes. In:
KABIR. Cem poemas. Seleção e tradução ao inglês de R. Tagore. Tradução,
ensaios e notas de José Tadeu Arantes. São Paulo: Attar, 2013. p. 35.
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