Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 16 de abril de 2022

Charles Baudelaire - A Varanda

Lembranças de uma relação amorosa (ou seria melhor dizer erótica?!) são o tema destas seis quintilhas, por meio das quais o ente lírico pondera sobre a sua felicidade passada, esperando revivê-la no futuro, no instante mesmo em que são evocadas imagens de um suntuoso sol que aos poucos se põe – cena tantas vezes associada à passagem do tempo e ao expirar.

 

A mulher amada, atraente e de hálito “venenoso”, também exerce a função de “mãe”, especificamente no que tange ao engendro das memórias do falante, sendo os laços assim mantidos semelhantes aos de um filho que se posta ao seu regaço, exigindo-lhe carícias. E, diante dessa aparente dualidade, se pode apreender com mais contundência o sentido dos versos preambulares: “Tu, todo o meu prazer! Tu, todo o meu dever!”

 

J.A.R. – H.C.

 

Charles Baudelaire

(1821-1867)

 

Le Balcon

 

Mère des souvenirs, maîtresse des maîtresses,

Ô toi, tous mes plaisirs! ô toi, tous mes devoirs!

Tu te rappelleras la beauté des caresses,

La douceur du foyer et le charme des soirs,

Mère des souvenirs, maîtresse des maîtresses!

 

Les soirs illuminés par l’ardeur du charbon,

Et les soirs au balcon, voilés de vapeurs roses.

Que ton sein m’était doux! que ton coeur m’était bon!

Nous avons dit souvent d’impérissables choses

Les soirs illuminés par l’ardeur du charbon.

 

Que les soleils sont beaux dans les chaudes soirées!

Que l’espace est profond! que le coeur est puissant!

En me penchant vers toi, reine des adorées,

Je croyais respirer le parfum de ton sang.

Que les soleils sont beaux dans les chaudes soirées!

 

La nuit s’épaississait ainsi qu’une cloison,

Et mes yeux dans le noir devinaient tes prunelles,

Et je buvais ton souffle, ô douceur! ô poison!

Et tes pieds s’endormaient dans mes mains fraternelles.

La nuit s’épaississait ainsi qu’une cloison.

 

Je sais l’art d’évoquer les minutes heureuses,

Et revis mon passé blotti dans tes genoux.

Car à quoi bon chercher tes beautés langoureuses

Ailleurs qu’en ton cher corps et qu’en ton coeur si doux?

Je sais l’art d’évoquer les minutes heureuses!

 

Ces serments, ces parfums, ces baisers infinis,

Renaîtront-ils d’un gouffre interdit à nos sondes,

Comme montent au ciel les soleils rajeunis

Après s’être lavés au fond des mers profondes?

– Ô serments! ô parfums! ô baisers infinis!

 

Varanda em Buenos Aires

(Fabian Perez: artista argentino)

 

A Varanda

 

Mãe das recordações, amante das amantes,

Tu, todo o meu prazer! Tu, todo o meu dever!

Hás de lembrar-te das carícias incessantes,

Da doçura do lar à luz do entardecer,

Mãe das recordações, amante das amantes!

 

As tardes à lareira, ao calor do carvão,

E as tardes na varanda, entre róseos matizes.

Quão doce era o seu seio e meigo coração!

Dissemo-nos os dois as coisas mais felizes

Nas tardes à lareira, ao calor do carvão!

 

Quão soberbo era o sol nas tardes douradas!

Que profundo era o espaço e como a alma era langue!

Curvado sobre ti, rainha das amadas,

Eu julgava aspirar o aroma de teu sangue.

Quão soberbo era o sol nessas tardes douradas!

 

A noite se adensava igual a uma clausura,

E no escuro os meus olhos viam-te as pupilas;

Teu hálito eu sorvia, ó veneno, ó doçura!

E dormiam teus pés em minhas mãos tranquilas.

A noite se adensava igual a uma clausura.

 

Sei a arte de evocar as horas mais ditosas,

E revivo o passado imerso em teu regaço.

Para que procurar belezas voluptuosas

Se as encontro em teu corpo e em teu cálido abraço?

Sei a arte de evocar as horas mais ditosas.

 

Juras de amor, perfumes, beijos infinitos,

De um fundo abismo onde não chegam nossas sondas

Voltareis, como o sol retorna aos céus benditos

Depois de mergulhar nas mais profundas ondas?

– Juras de amor, perfumes, beijos infinitos!

 

Referência:

 

BAUDELAIRE, Charles. Le balcon / A varanda. Tradução de Ivan Junqueira. In: __________. As flores do mal. Texto integral. Apresentação de Marcelo Jacques. Tradução, introdução e notas de Ivan Junqueira. Edição especial. Rio de Janeiro, RJ: Nova Fronteira, 2012. Em francês: p. 198 e 200; em português: p. 199 e 201. (Coleção ‘Saraiva de Bolso’)

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