Os versos deste poema
contêm respostas a perguntas sobre o infinito, a política, o estilo e o amor,
que teriam sido formuladas por um hipotético entrevistador ao poeta, sendo que,
em relação aos três primeiros, o falante revela a sua descrença e, quanto ao
último – o amor –, julga ser a mais “séria” de todas as experiências humanas.
Como se nota, estão aí
dois dos principais elementos temáticos da poesia de Benedetti, a saber, a política
e o amor, pois que a literatura sempre há de manter algum liame com a realidade,
abrindo-nos as portas descortinadoras de outros mundos, outras possibilidades de
existência, com liberdade, compromisso e assunção dos riscos consectários.
J.A.R. – H.C.
Mario Benedetti
(1920-2009)
Interview
No es ninguna
molestia
explicarle qué pienso
del infinito
el infinito es
sencillamente
un agrio viento frío
que eriza las mucosas
la piel
y las metáforas
le pone a uno en los
ojos
lágrimas de rutina
y en la garganta un
nudo
de sortilegio
seguramente usted ya
se dio cuenta
en el fondo no creo
que exista el
infinito.
Bueno sobre política
jesús
sobre política
mi bisabuelo que era
liberal
espiaba a las criadas
en el baño
mi abuelo el
reaccionario
extraviaba la llave
de sus deudas
mi padre el comunista
compraba hectáreas
con gesto de asco
yo soy poeta
señor
y usted debe saber
que los poetas
vivimos a la vuelta
de este mundo
claro que usted quizá
no tenga tiempo
para tener paciencia
pero debe conocer que
en el fondo
yo no creo en la
política.
Por supuesto el
estilo
qué pienso del estilo
una cosa espontánea
que se va haciendo sola
siempre escribí en la
cama
mucho mejor que en
los ferrocarriles
qué más puedo agregar
ah domino el sinónimo
módico exíguo
corto insuficiente
siempre escribo
pensando en el futuro
pero el futuro
se quedó sin magia
me olvidaba que usted
ya sabe que en el
fondo
yo no creo en el
estilo.
El amor el amor
ah caramba
el amor
por lo pronto me
gusta
la mujer
bueno fuera
el alma
el corazón
sobre todo las
piernas
poder alzar la mano
y encontrarla a la
izquierda
tranquila
o intranquila
sonriendo desde el
pozo
de su última modorra
o mirando mirando
como a veces se mira
un rato antes del
beso
después de todo
usted y yo sabemos
que en el fondo
el amor
el amor
es una cosa seria.
Por favor
esto último
no vaya a publicarlo.
Dois viajantes
(Jack Butler Yeats: artista
irlandês)
Interview
Não é nenhum incômodo
explicar-lhe o que
penso do infinito
o infinito é
simplesmente
um rude vento frio
que arrepia as
mucosas
a pele
e as metáforas
e nos põe nos olhos
lágrimas de rotina
e na garganta um nó
de sortilégio
seguramente você já
se deu conta
que no fundo não
creio
que exista o
infinito.
Bem sobre política
jesus
sobre política
meu bisavô que era
liberal
espiava as criadas no
banheiro
meu avô o reacionário
extraviava as chaves
de suas dívidas
meu pai comunista
comprava hectares com
um gesto de nojo
eu sou poeta
meu senhor
e você deve saber que
os poetas
vivemos na virada
desse mundo
claro que você talvez
não tenha tempo
para ter paciência
mas deve saber que no
fundo
eu não acredito na
política.
Logicamente o estilo
o que penso do estilo
uma coisa espontânea
que se vai fazendo só
sempre escrevi na
cama
muito melhor que nos
trens
que mais posso
acrescentar
ah domino o sinônimo
módico exíguo
curto insuficiente
sempre escrevo
pensando no futuro
mas o futuro
ficou sem magia
me esquecia que você
já sabe que no fundo
eu não acredito no
estilo.
O amor o amor
ah caramba
o amor
de cara me agrada
a mulher
bom seria
a alma
o coração
sobretudo as pernas
poder levantar a mão
e encontrar a
esquerda
tranquila
ou intranquila
sorrindo desde o poço
da sua última
preguiça
ou olhando olhando
como às vezes se olha
um pouco antes do
beijo
depois de tudo
você e eu sabemos
que no fundo
o amor
o amor
é uma coisa séria.
Por favor
isto último
não vá publicar.
Referência:
BENEDETTI, Mario.
Interview. Tradução de Julio Luís Gehlen. In: __________. Antologia poética.
Edição bilíngue. Seleção, tradução e apresentação de Julio Luís Gehlen.
Ilustrações de Luiz Trimano. Rio de Janeiro, RJ: Record, 1988. Em espanhol: p.
224, 226 e 228; em português: p. 225, 227 e 229.
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário