Como na relação de um pai já decrépito e um filho ainda moço, a voz poética regozija-se com o relacionamento mantido com a sua jovem amada, a quem serve de guia a propiciar-lhe ajustes em seus senões e lacunas, tornando-a digna de louvores, enfatizando ainda mais os seus próprios atributos, a exemplo da beleza e da inteligência.
A alegria da amante torna-se, assim, a alegria do próprio falante, pois que este vê na consorte tudo aquilo que, por igual, seria capaz de desejar para si mesmo, reconfortando-se desse modo de sua idade avançada. Afinal, tal panorama sói acontecer em sociedade, quando homens muito mais velhos desposam jovens esposas, buscando consorciar-se com alguém de estirpe no esplendor da beleza, dotada de talento e de vivacidade de espírito.
J.A.R. – H.C.
William Shakespeare
The Cobbe portrait (1610)
(1564-1616)
Sonnet XXXVII
As a decrepit father takes delight
To see his active child do deeds of youth,
So I, made lame by Fortune’s dearest spite,
Take all my comfort of thy worth and truth;
For whether beauty, birth, or wealth, or wit,
Or any of these all, or all, or more,
Entitled in thy parts, do crowned sit,
I make my love engrafted to this store:
So then I am not lame, poor, nor despised,
Whilst that this shadow doth such substance give
That I in thy abundance am sufficed,
And by a part of all thy glory live.
Look what is best, that best I wish in thee:
This wish I have; then ten times happy me!
Velho tenta seduzir uma jovem
(Willem van Mieris: pintor holandês)
Soneto XXXVII
Tal como um velho pai se sente satisfeito,
Ao ver fazer o filho ações da juventude,
Eu, sofrendo do fado o mais duro despeito,
Me conforto, a admirar a tua magnitude.
A estirpe, a formosura, a riqueza, ou o talento,
Ou isso totalmente ou mais do que isso ainda,
Sublimizado em ti, te faz coroado assento,
E atrai o meu amor com sedução infinda.
E vai-se todo o mal com que me oprime o fado.
É que em tua sombra tanta e tal substância existe,
Que nada e nada, enfim, se me faz desejado.
Em parte vivo, então, da glória que te assiste.
Vê o que há melhor. Ah! fosse o que há melhor só
teu!...
Quanto mais feliz tu, tanto mais feliz eu.
Referências:
Em Inglês
SHAKESPEARE, William. Sonnet XXXVII. In: KEILLOR, Garrison (Selector and Introducer). Good poems. New York, NY: Penguin Books, 2003. p. 177.
Em Português
SHAKESPEARE, William. Soneto XXXVII.
Tradução de Jerónimo de Aquino. In: __________. Sonetos. Tradução de
Jerónimo Aquino. São Paulo, SP: Martin Claret, 2006. p. 63. (Coleção ‘‘A
Obra-Prima de Cada Autor’; n. 249)
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