Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

Miodrag Pávlovitch - Réquiem

Sob um viés funesto, os versos deste poema, sem quaisquer sinais de pontuação, acabam por difundir uma mensagem de cujas réstias avulta o olhar irônico e até mesmo corrosivo da voz lírica, diante da indolência, da passividade, dos interesses não explicitamente revelados – porque hipócritas –, com que a maioria das pessoas enfrenta a desventura de alguém que experimenta o trespasse da morte.

O réquiem consagra-se a tudo o que de mais humano haja se desencaminhado na sociedade – valores consistentes, espírito coletivo, solidariedade, sensibilidade empática – em contraposição à prevalência do ego, o homem alienado de seus pares, indiferente e tíbio, a dar mais ênfase aos contornos do próprio umbigo.

Frente aos estertores da morte, nesse “bosque de maldições”, a soturna música presta-se a nos alertar para as sendas de solidões e de superficialidades nas quais, em épocas recentes, ousamos adentrar. Teremos futuro?...

J.A.R. – H.C.

 

Miodrag Pávlovitch

(1928-2014)

 

Реквиjем

 

Овога пута

умро jе неко близу

 

Реквиjем

у сивом парку

под затвореним небом

 

Жене су пошле за мртвим телом

смрт jе остала у празноj соби

и спустила завесу

 

Осетите

свет jе постао лакши

за jедан људски мозак

 

Приjатна тишина после ручка

босоног дечак седи на капиjи

и jеде грожђе

 

Зар ико

остане веран ономе што изгуби

 

Не журите се са смрћу

нико на никог не личи

синови мисле на играчке

 

И не опраштаjте се при одласку

то jе смешно

и погрдно

 

Réquiem

(Sarychev Alexander: pintor russo)

 

Réquiem

 

Desta vez

morreu alguém por perto

 

Réquiem

no parque cinzento

sob o céu carrancudo

 

As mulheres seguiram o corpo morto

a morte ficou no quarto vazio

e desceu a cortina

 

Sintam

o mundo ficou mais leve

por um cérebro humano

 

Silêncio agradável depois do almoço

o menino descalço senta-se ao portão

e come uvas

 

Será que alguém permanece fiel

àquilo que perdeu

 

Vocês não devem ter pressa com a morte

ninguém se parece com ninguém

os filhos pensam em brinquedos

 

E não se despeçam ao partir

isso é engraçado

e ofensivo


Referência:

PÁVLOVITCH, Miodrag. Реквиjем / Réquiem. Tradução de Aleksandar Jovanović. n: __________. Bosque da maldição. Seleção, introdução e tradução de Aleksandar Jovanović. Edição bilíngue. Brasília, DF: Editora da UnB, 2003. Em sérvio: p. 100 e 102; em português: p. 101 e 103. (Coleção ‘Poetas do Mundo’, dirigida por Henryk Siewierski)

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