Nemerov discorre sobre a simplicidade e a beleza das coisas, perante o fluxo do quotidiano, assim como as vislumbra nas obras pictóricas do holandês Johannes Vermeer (1632-1675), sugerindo-nos que as apreciemos, tanto aquelas a que faz menção no infratranscrito poema [tente identificá-las, leitor(a)], quanto muitas outras – a exemplo das exibidas como resposta a esta pesquisa no Google.
Se me fosse concedida a oportunidade de uma glosa, diria que a modéstia que o falante atribui às telas de Vermeer é também a lhanura que se depreende dos versos do poeta – luz que se difunde sob um olhar sereno sobre o mundo, apreendendo da natureza a poesia, não transfigurada em outras tantas representações, senão tal como ela exatamente se nos mostra.
J.A.R. – H.C.
Howard Nemerov
(1920-1991)
Vermeer
Taking what is, and seeing it as it is,
Pretending to no heroic stances or gestures,
Keeping it simple; being in love with light
And the marvelous things that light is able to do,
How beautiful! a modesty which is
Seductive extremely, the care for daily things.
At one for once with sunlight falling through
A leaded window, the holy mathematic
Plays out the cat’s cradle of relation
Endlessly; even the inexorable
Domesticates itself and becomes charm.
If I could say to you, and make it stick,
A girl in a red hat, a woman in blue
Reading a letter, a lady weighing gold…
If I could say this to you so you saw,
And knew, and agreed that this was how it was
In a lost city across the sea of years,
I think we should be for one moment happy
In the great reckoning of those little rooms
Where the weight of life has been lifted and made
light,
Or standing invisible on the shore opposed,
Watching the water in the foreground dream
Reflectively, taking a view of Delft
As it was, under a wide and darkening sky.
Mulher de azul lendo uma carta
(Johannes Vermeer: pintor holandês)
Vermeer
Tomar algo pelo que é, e vê-lo tal como é,
Sem pretender posturas ou gestos heroicos,
Mantendo-o na simplicidade; ser atraído pela luz
E pelas coisas que a luz é capaz de despertar,
Que belo! uma modéstia que é sedutora
Ao extremo, o interesse por coisas quotidianas.
De uma vez por todas, com a luz do sol a penetrar
Por um vitral chumbado, a sagrada matemática
Reproduz o emaranhado de uma relação,
Indefinidamente; mesmo o inexorável
Domestica-se e converte-se em encanto.
Se vos pudesse elencar, levando-vos a prosseguir,
‘Moça com chapéu vermelho’, ‘Mulher de azul
Lendo uma carta’, ‘Uma senhora pesando ouro’...
Se vos pudesse indicar isso para que vejais,
Conheçais e estejais concordes de que assim se
passou
Numa cidade desaparecida por efeito de um mar de
anos,
Penso que deveríamos estar felizes por um momento
No grande ajuste de contas desses pequenos recintos
Onde o peso da vida foi levantado e tornado leve,
Ou, permanecendo invisíveis na margem oposta,
Observar a água em primeiro plano num sonho,
Reflexivamente, tendo uma ‘Visão de Delft’,
Tal como era a cidade, sob um céu turvo e amplo.
Referência:
NEMEROV, Howard. Vermeer. In: KEILLOR,
Garrison (Selector and Introducer). Good poems. New York, NY: Penguin
Books, 2003. p. 226.
Nenhum comentário:
Postar um comentário