Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 30 de janeiro de 2022

Carlos Drummond de Andrade - Fragilidade

O poema, essa compilação de versos sempre aquém das abrangentes representações do que se nos mostra tangível, nada mais é que um arabesco, mera tentativa de se condensar o sentido último da realidade, terminantemente irredutível às limitadas possibilidades da linguagem.

O rúptil, o instável, o contingente, a impermanência, enfim, são parte desse mundo inefável traduzido em alegorias, símbolos, metáforas, repletas de beleza – é claro –, singularizadas num instantâneo que é eternidade ao espírito, mas sempre a desvanecer-se antes que o sonho nos tenha levado a adentrar os portões do paraíso.

J.A.R. – H.C.

 

Carlos Drummond de Andrade

(1902-1987)

 

Fragilidade

 

Este verso, apenas um arabesco

em torno do elemento essencial – inatingível.

Fogem nuvens de verão, passam aves, navios, ondas,

e teu rosto é quase um espelho onde brinca o incerto movimento,

ai! já brincou, e tudo se fez imóvel, quantidades e quantidades

de sono se depositam sobre a terra esfacelada.

Não mais o desejo de explicar, e múltiplas palavras em feixe

subindo, e o espírito que escolhe, o olho que visita, a música

feita de depurações e depurações, a delicada modelagem

de um cristal de mil suspiros límpidos e frígidos: não mais

que um arabesco, apenas um arabesco

abraça as coisas, sem reduzi-las.

 

Em: “A Rosa do Povo” (1945)

 

Fim do Arabesco

(Edgar Degas: pintor francês)


Referência:

ANDRADE, Carlos Drummond. Fragilidade. In: __________. A rosa do povo / Claro enigma: 2 livros em 1. Rio de Janeiro, RJ: BestBolso, 2010. p. 53. (Coleção “Saraiva Vira-Vira”; Poesia Clássica)

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