O poeta sueco lança-se a uma deliberada polêmica quando enfatiza, em nuances hostis, o lado visualmente carregado de Estocolmo ao longo da quadra do Advento – como a que ora avança –, transpassando-lhe os olhos com “quinquilharias e estrelas de sujas tintas”, levando-o a rematar que a Terra nem como uma casa se parece, tampouco como um lugar de exílio: “Caí e aterrei aqui”, declara ele.
Seja como for, há algo de pilhérico nos versos de Aspenström, quando se pretende retratado como um alce, andando pelas ruas de Estocolmo: sua percuciente mirada binocular dirige-se a campanários banhados a ouro, a escavadoras abrindo um túnel e a um barco de bandeira finlandesa rumando ao molhe para ali fundear. E então sumaria: “Passageiros, agentes da aduana, cabrestantes, um barulho dos infernos!” – cenário de um país em erupção, nada calmo para uma estação fria na Escandinávia! Ali por perto, na Lapônia (FI), Papai Noel já começa a atrelar suas renas ao trenó para mais uma missão à volta do mundo.
J.A.R. – H.C.
Werner Aspenström
(1918-1997)
Porträtt i december
Avbilda mig gärna som en älg
vandrande på Stockholms gator,
bokförd, ej hemmastadd.
Advent gör saken värre med tingel
tangel och grisfärgade stjärnor.
Mycket smakar beskt i denna tid.
Å andra sidan: främlingskap
är ett alltför stort ord
på alltför mångas läppar.
Planeten T är varken ett hem
eller en förvisningsort.
Jag föll och landade här.
Sju kyrktorn i kikaren,
guldstoft mer än nog!
Granit!
Rök bolmar ur tunnelgapet,
grävskopor vaggar,
dinosauriskt!
Den vita näverbåten från Finland
kanar mot kajen och förtöjs.
Resenärer, tullnärer, vinschar,
ett helvetes larm!
Jag dricker mitt morgonkaffe och tänker:
att samla ved till en lovsång.
Poet, inte nagelbitare!
In: “Dikter under träden” (1956)
Retrato em dezembro
Representai-me antes como um alce
vagueando pelas ruas de Estocolmo,
contabilizado, não domiciliado.
O Advento ainda torna as coisas pior com
quinquilharias e estrelas de sujas tintas.
Muito há de amargo sabor nesta quadra.
Por outro lado – estrangeiro ser
é expressão demasiado grande
em demais lábios de muitos.
Não é pátria o planeta T
nem lugar de desterro.
Caí e aterrei aqui.
Seis campanários no binóculo,
ouro em pó mais que bastante!
Granito!
Sai o fumo em nuvens da boca do túnel,
movem-se as escavadoras,
dinossauricamente!
O branco barco de casca de bétula da Finlândia
desliza rumo ao cais e fundeia.
Viajantes, aduaneiros, gruas,
um barulho infernal!
Bebo meu café da manhã e penso:
concentrar-me para um hino.
Poeta, não roedor de unhas.
Em: “Poemas sob as árvores” (1956)
Referências:
Em Sueco:
ASPENSTRÖM, Werner. Porträtt i december. In: ISAKSSON, Hans. Werner Aspenström: litterär profil. Första e-boksutgåvan. Stockholm, SE: Natur och Kultur, 2004. p. 62-63.
Em Português
ASPENSTRÖM, Werner. Retrato em dezembro. Tradução de Silva Duarte. In: DUARTE, Silva (Seleção e tradução). Cinco poetas suecos (II): Maria Wine, Werner Aspenström, Lars Forssell, Tomas Tranströmer e Lasse Söderberg. Antologia em versão direta de Silva Duarte. Barcelos, PT: Companhia Editora do Minho, 1981. p. 40.
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