Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

Geir Campos - Matinal

Nesta “paisagem” matinal do poeta e tradutor capixaba tem-se a confrontação de situações fáticas assentes em polos opostos, alternativos para o ente lírico, que se pergunta a quem deve direcionar o seu costumeiro bom-dia: ora bem, de um lado, descritivos associados aos aquinhoados pela sorte e, do outro, à ampla maioria daqueles que labutam e labutam, para pouco ir mais além do que se manterem vivos.

Na sociedade brasileira, ainda hoje há notórios remanescentes do que o polímata pernambucano Gilberto Freyre assinalou em “Casa Grande & Senzala” (1933), a saber, no âmbito da servidão, a díade senhor e escravo, depois o usineiro (ou pelo quase sempre oculto capitalista) e o pária de usina, e mais recentemente, o grande capitalista e a majoritária massa de recursos humanos, no mais das vezes com limitada qualificação. Resultado: ampla concentração de renda, tornando o país o nono país mais desigual do mundo (dados de 2019), com negros e mulheres em pior situação.

J.A.R. – H.C.

 

Geir Campos

(1924-1999)

 

Matinal

 

Bom-dia, a quem dedicá-lo?

Ao que canta antes do galo

ou ao que tarda na cama?

A quem fartos ubres mama

ou a quem dão café ralo?

Ao que bebe no gargalo

ou ao que a adega vigia?

Ao moço da estrebaria

ou ao dono do cavalo?

A quem folga no intervalo

ou a quem o manda tocar?

Ao que jejua no mar

ou ao que ceia o robalo?

A quem lhe aumenta o regalo

ou a quem tudo lhe falta?

Ao rei da renda, mais alta

ou ao mais puro vassalo?

Bom-dia, vindo, a quem dá-lo?

 

Matina

(Saulo Pfeiffer: artista paranaense)


Referência:

CAMPOS, Geir. Matinal. In: CAMPOS, Milton de Godoy (Ed.). Antologia poética da geração de 45. 1ª série. São Paulo, SP: Clube de Poesia, 1966. p. 132.

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