Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 14 de outubro de 2021

Thiago de Mello - Poema Concreto

O interessante neste poema do poeta amazonense é a antítese que se cria entre o título que lhe foi atribuído – a veicular a ideia de algo deveras tangível, palpável, concreto em sua existência –, e o sentido de suas linhas, a contemplar o vazio não exatamente caracterizável, uma vez que insinuado por conjecturas e sintetizado em seu derradeiro verso: “O que tu tens, não tens”.

E esse vazio – a falta, a ausência, a privação, o vácuo – é toda a substância da dor que lateja pelo avesso no ente a que se refere o falante, levando-o a alimentar-se da própria fome, tornando-lhe a vida algo insubsistente, um invólucro, o continente onde talvez falte o principal de todos os conteúdos: a poção do amor.

J.A.R. – H.C.

 

Thiago de Mello

(n. 1926)

 

Poema Concreto

 

O que tu tens e queres

saber (porque te dói),

não tem nome. Só tem

(mas vazio) o lugar

que abriu em tua vida

a sua própria falta.

 

A dor te dói pelo avesso,

perdida nos teus escuros.

É como alguém que come

não o pão, mas a fome.

 

Sofres de não saber

o que não tens e falta

num lugar que nem sabes,

mas que é na tua vida,

quem sabe é em teu amor.

 

O que tu tens, não tens.

 

Melancolia

(Edgar Degas: pintor francês)


Referência:

MELLO, Thiago. Poema concreto. In: __________. Faz escuro mas eu canto porque a manhã vai chegar. 10 ed. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira, 1985. p. 63. (Coleção ‘Vera Cruz’ – Literatura Brasileira; v. 96)

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