Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 13 de outubro de 2021

Charles Simic - Garfo

A voz lírica, neste poema, fala-nos como devemos nos sentir, quando estamos no uso de um simples garfo, vale dizer, a empregar certa violência, ainda que simbólica, por trás do que, para uma pessoa dita civilizada, tem-se por normal: carnívoros como somos, recorremos a técnicas que, de algum modo, assemelham-se às empregadas por canibais.

Afinal, ao que se pareceria o que o poeta descreve como “grande, calva, careca e cega”? A cabeça de um ser humano já destrinchada por um canibal ancestral, para acudir-lhe como um totem ou algo análogo, enquanto que o resto do corpo, melhor dizendo, a carne, vai direto à mesa, servindo-lhe de alimento – num procedimento que, nos dias que correm, aflora-nos sobremodo repulsivo.

J.A.R. – H.C.

 

Charles Simic

(n. 1938)

 

Fork

 

This strange thing must have crept

Right out of hell.

It resembles a bird’s foot

Worn around the cannibal’s neck.

 

As you hold it in your hand,

As you stab with it into a piece of meat,

It is possible to imagine the rest of the bird:

Its head which like your fist

Is large, bald, beakless and blind.

 

Natureza-morta: tarde

(Fred Bell: pintor norte-americano)

 

Garfo

 

Esta coisa estranha deve ter-se arrastado

diretamente desde o inferno.

Assemelha-se à pata de um pássaro

Usada à volta do pescoço de um canibal.

 

Ao segurá-lo na mão,

Enquanto se espeta com ele um pedaço de carne,

É possível imaginar o restante do pássaro:

Sua cabeça, tal como o teu punho,

É grande, calva, sem bico e cega.


Referência:

SIMIC, Charles. Fork. In: MAYES, Frances. The discovery of poetry: a field guide to Reading and writing poems. 1st Harvest ed. San Diego, CA: Harvest & Harcout, 2001. p. 133.

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