Pound diz lamentar aqueles que se encontram em situação melhor do que a sua e a de um não identificado amigo, isto por serem ricos, pois não teriam amigos, senão apenas mordomos – sejam lá quais forem os atributos, presumivelmente não oportunos, que estes possam estampar –, estendendo tais lamentos, ainda, aos “casados e solteiros” – o que implicaria abarcar todo mundo! Ou haveria uma zona de transição? (rs)
O poeta, de fato, canta loas a uma vida simples, despojada até – como seria de se esperar a quem vive numa água-furtada –, no curso da qual despertaria com a luz dourada do amanhecer a penetrar-lhe o recinto como uma bailarina de pés leves e pequenos – a russa Anna Pavlova (1881-1931) serve-lhe de referência –, junto à sua amada, musa de seus mais recônditos anelos.
J.A.R. – H.C.
Ezra Pound
(1885-1972)
The Garret
Come, let us pity those who are better off
than we are.
Come, my friend, and remember
that the rich have butlers and no friends,
And we have friends and no butlers.
Come, let us pity the married and the unmarried.
Dawn enters with little feet
like a gilded Pavlova
And I am near my desire.
Nor has life in it aught better
Than this hour of clear coolness,
the hour of waking together.
In: “Lustra” (1916)
A Água-furtada
(Carl Spitzweg: pintor alemão)
A Água-furtada
Vamos, lamentemos os que estão em melhor
situação que a nossa.
Vamos, meu amigo, e lembra-te:
os ricos têm mordomos e não têm amigos,
E nós temos amigos e não temos mordomos.
Vamos, lamentemos os casados e os solteiros.
A aurora entra com pés pequenos
Pavlova dourada,
E estou perto do meu desejo.
E a vida não tem nada de melhor
Que esta hora de claro frescor,
a hora de acordar juntos.
Em: “Lustra” (1916)
Referências:
Em Inglês
POUND, Ezra. The garret. In: __________. Ezra Pound’s poetry and prose. Contributions to periodicals in ten volumes. Volume I: 1902-1914 (C0-C167). New York (NY) & London (EN): Garland Publishing Inc., 1991. p. 133.
Em Português
POUND, Ezra. A água-furtada. Tradução
de Mário Faustino. In: FAUSTINO, Mário. Melhores poemas de Mário Faustino.
Seleção de Benedito Nunes. 3. ed. São Paulo, SP: Global, 2000. p. 97.
(‘Melhores Poemas’; n. 14)
A Água-Furtada, belo poema de Esra Pound, é o nome da emoção desse instante, com o impecável registro de leitura do autor do blog, J. A. Rodrigues. (Geraldo Reis - www.poetageraldoreis.blogspot.com BH, 25 Jan 2023.
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