Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 26 de agosto de 2021

William Empson - Ignorância da Morte

Em sete tercetos Empson põe-se a elucubrar sobre a morte e o que ela representaria para a nossa civilização, ou melhor, para budistas, cristãos e até mesmo comunistas: ao final, conclui que, embora se sinta muito em branco com relação ao assunto, o mais indicado é que a maioria das pessoas deva estar preparada para deixá-lo mesmo em branco!

Se me for permitida uma rápida digressão, poderia sugerir uma leitura muito bem fundamentada sobre o tema: a obra “História da Morte no Ocidente”, do historiador francês Philippe Ariès (1914-1984), na qual o autor se detém a afirmar que a fuga da morte parece ser a tentação maior do Ocidente. E essa recusa em sequer pensar na morte, manifestada nos derradeiros versos deste poema de Empson, não nos deixa mentir! (rs)

J.A.R. – H.C.

 

William Empson

(1906-1984)

 

Ignorance of Death

 

Then there is this civilizing love of death, by which

Even music and painting tell you what else to love.

Buddhists and Christians contrive to agree about death

 

Making death their ideal basis for different ideals.

The communists however disapprove of death

Except when practical. The people who dig up

 

Corpses and rape them are I understand not reported.

The Freudians regard the death-wish as fundamental,

Though the ‘clamour of life’ proceeds from its rival ‘Eros’.

 

Whether you are to admire a given case for making less clamour

Is not their story. Liberal hopefulness

Regards death as a mere border to an improving picture.

 

Because we have neither hereditary nor direct knowledge of death

It is the trigger of the literary man’s biggest gun

And we are happy to equate it to any conceived calm.

 

Heaven me, when a man is ready to die about something

Other than himself, and is in fact ready because of that,

Not because of himself, that is something clear about himself.

 

Otherwise I feel very blank upon this topic,

And think that though important, and proper for anyone to bring up,

It is one that most people should be prepared to be blank upon.

 

A vitória de Eros

(Angelica Kauffmann: pintora suíça)

 

Ignorância da Morte

 

Então há este amor civilizador pela morte, pelo qual

Até a música e a pintura dizem-te o que mais há para amar.

Budistas e cristãos esforçam-se por chegar a acordo sobre a morte,

 

Dela lançando mão como base ideal para distintos ideais.

Os comunistas, contudo, desaprovam a morte,

Exceto quando nela há praticidade. As pessoas que desenterram

 

Cadáveres e violam-nos não são, conforme creio, denunciadas.

Os freudianos consideram fundamental o desejo de morte,

Ainda que o “clamor de vida” provenha de seu rival ‘Eros’.

 

Supor-se que se admire um certo caso por fazer menos clamor

Fica à margem de sua história. A perspectiva liberal

Reputa a morte como mero linde para um panorama melhorado.

 

Em razão de não termos noção direta nem hereditária da morte,

Torna-se ela o gatilho da maior arma do homem das letras –

E estamos felizes por equipará-la a qualquer concebida calma.

 

Deus meu, quando um homem está disposto a morrer por algo

Que não seja por si mesmo, e de fato prontifica-se por razão diversa,

Não por razões que lhe tocam, isso diz com clareza sobre si próprio.

 

Sob outra mirada, sinto-me muito no vazio acerca deste tema,

E penso que embora crucial e oportuno para quem quer que o suscite,

É um dos que passar em branco deveria ser o mote para a maioria.


Referência:

EMPSON, William. Ignorance of death. In: RODMAN, Selden (Ed.). An new anthology of modern poetry. New York, NY: Random House Inc., 1946. p. 335. (“The Modern Library”)

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