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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 18 de agosto de 2021

Emily Dickinson - Um tipo estreito na grama

A voz poética, sem nunca empregar a palavra “serpente”, descreve neste poema a experiência, a ameaça e o medo de deparar com uma delas: a serpente é o mais distanciado símbolo do ardil e do ludíbrio de que se tem notícia, presente que está na cena em que leva de vencidos os desvelos de Eva – e logo também os de Adão – em relação ao fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal.

Má sorte, enganos, ilusões são efeitos do relacionamento humano, e uma serpente acaba por ser a metáfora preferencial de uma criatura da espécie que se sugere de imediato nas primeiras linhas do poema: não sem motivos, distintamente da cordialidade com que se tratam o falante e os demais animais, o relacionamento com a serpente engendra no primeiro “um aperto na garganta, e nos ossos o grau zero”.

J.A.R. – H.C.

 

Emily Dickinson

(1830–1886)

 

A narrow fellow in the grass

 

A narrow Fellow in the Grass

Occasionally rides –

You may have met him? Did you not

His notice instant is –

 

The Grass divides as with a Comb,

A spotted Shaft is seen,

And then it closes at your Feet

And opens further on –

 

He likes a Boggy Acre – 

A Floor too cool for Corn –

But when a Boy and Barefoot

I more than once at Noon

 

Have passed I thought a Whip Lash

Unbraiding in the Sun

When stooping to secure it

It wrinkled And was gone –

 

Several of Nature’s People

I know, and they know me

I feel for them a transport

Of Cordiality

 

But never met this Fellow

Attended or alone

Without a tighter Breathing

And Zero at the Bone.

 

Serpente na grama

(Sharon Supplee: pintora norte-americana)

 

Um tipo estreito na grama

 

Um tipo estreito na grama

Desliza ocasionalmente;

Tu certamente o conheces, –

Sempre chega de repente.

 

Esta coluna manchada

Parte a relva como um pente;

Debaixo dos pés se fecha

Para se abrir mais à frente.

 

Aprecia um pantanal.

Terra que o milho acha fria;

Quando garoto, e descalço,

Às vezes, ao meio-dia,

 

Julgava ver um açoite

Que à luz do sol se estendia...

Mas, ao tentar segurá-lo,

Enrolava-se, e sumia.

 

Quanto ser da natureza

Conheço, que me conhece!

Ao vê-los, cordial transporte

No peito logo me cresce;

 

Mas, com outros ou sozinho,

Vendo esse tipo, o que espero

É um aperto na garganta,

E nos ossos o grau zero.


Referência:

DICKINSON, Emily. A narrow fellow in the grass / Um tipo estreito na grama. Tradução de Paulo Vizioli. In: VIZIOLI, Paulo (Seleção e Tradução). Poetas norte-americanos. Edição comemorativa do bicentenário da independência dos Estados Unidos da América: 1776-1976. Antologia bilíngue. São Paulo, SP: Editora Lidador, 1974. Em inglês e em português: p. 43-44.

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