O poeta manifesta o seu propósito de elaborar um poema transparente, intrépido, brandindo um apelo por liberdade, no exato instante em que o país se encontrava amordaçado por uma ditadura militar – digam o que disserem os negacionistas de plantão, inclusive aquele que reside, por ora, lá no Palácio da Alvorada! –, reforçando a silenciosa insubmissão do povo.
Um poema compacto, robusto como um forte, incólume aos ventos desfavoráveis, plantado em terreno fértil onde abrolha a flor da resistência, porque, como se costuma dizer, a vida é jogo venturoso e arriscado: o temor do revés não pode, contudo, sobrepujar a vontade de um desenlace favorável, tanto mais quando cingida por um ânimo coletivo.
J.A.R. – H.C.
Pedro Tierra
(n. 1948)
Aspiração
Hoje eu quero
um poema transparente,
semelhante à lágrima
que iludiu meus olhos desatentos.
Um poema capaz de coragem,
desses que podem ser ouvidos
na chuva, na greve, ao fim
da batalha perdida.
Um poema capaz de resistir
como granito ao vento,
como o homem resiste
se o aço lhe alcança o ombro.
Um poema capaz de liberdade.
Capaz de falar nesta hora noturna
quando todos dormem, e o silêncio oficial
amordaçou as cantigas do meu povo.
(1973)
Amordaçados
(Ricky Romain: artista inglês)
Referência:
TIERRA, Pedro. Aspiração. In:
__________. Poemas do povo da noite. 1. ed. São Paulo, SP: Editorial
Livramento, abr. 1979. p. 31.
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