Hoje, dia dos pais, apresento, vertido ao português, um poema bastante difundido de autoria do poeta e político venezuelano: o falante, presumivelmente pai de infantes, descreve como se sente todo aquele responsável por colocar crianças no mundo, sempre à espera de que lhe chegue ou bem o choro do universo ou bem o brilho das estrelas.
Ser pai é, sobretudo, expressar a ética pelo cuidado de seus rebentos, protegendo-os da violência do mundo – dos Herodes delinquentes e dos descalabros de falsos estadistas –, missão que, a propósito, estende-se às mães por igual, inclusas indubitavelmente no rol de responsáveis a que Blanco alude em seus versos.
Apenas a título de esclarecimento, faço ver que a terceira estrofe do poema reporta-se: (i) de início, talvez à pintura “Mulher cega com menino e cão”, do artista francês Alexandre Antigna (1817-1878); (ii) depois, certamente, ao famoso quadro “As Meninas” do pintor espanhol Diego Velázquez (1599-1660); (iii) em seguida, quiçá à tela “Maria Antonieta com seus filhos”, de Adolf Ulrich Wertmüller (1751-1811); (iv) em seguida, às conhecidas estampas de Santo Antônio, a exemplo da fixada no quadro “Santo Antônio de Pádua com o Menino”, do pintor espanhol Bartolomé Esteban Murillo (1617-1682); (v) e, por fim, à forma como se retrata a “Virgem de Coromoto”, padroeira da Venezuela.
J.A.R. – H.C.
Andrés Eloy Blanco
(1896-1955)
Los Hijos Infinitos
Cuando se tiene un hijo,
se tiene al hijo de la casa y al de la calle
entera,
se tiene al que cabalga en el cuadril de la mendiga
y al del coche que empuja la institutriz inglesa
y al niño gringo que carga la criolla
y al niño blanco que carga la negra
y al niño indio que carga la india
y al niño negro que carga la tierra.
Cuando se tiene un hijo, se tienen tantos niños
que la calle se llena
y la plaza y el puente
y el mercado y la iglesia
y es nuestro cualquier niño cuando cruza la calle
y el coche lo atropella
y cuando se asoma al balcón
y cuando se arrima a la alberca;
y cuando un niño grita, no sabemos
si lo nuestro es el grito o es el niño,
y si le sangran y se queja,
por el momento no sabríamos
si el ¡ay! es suyo o si la sangre es nuestra.
Cuando se tiene un hijo, es nuestro el niño
que acompaña a la ciega
y las Meninas y la misma enana
y el Príncipe de Francia y su Princesa
y el que tiene San Antonio en los brazos
y el que tiene la Coromoto en las piernas.
Cuando se tiene un hijo, toda risa nos cala,
todo llanto nos crispa, venga de donde venga.
Cuando se tiene un hijo, se tiene el mundo adentro
y el corazón afuera.
Y cuando se tienen dos hijos
se tienen todos los hijos de la tierra,
los millones de hijos con que las tierras lloran,
con que las madres ríen, con que los mundos sueñan,
los que Paul Fort quería con las manos unidas
para que el mundo fuera la canción de una rueda,
los que el Hombre de Estado, que tiene un lindo
niño,
quiere con Dios adentro y las tripas afuera,
los que escaparon de Herodes para caer en Hiroshima
entreabiertos los ojos, como los niños de la
guerra,
porque basta para que salga toda la luz de un niño
una rendija china o una mirada japonesa.
Cuando se tienen dos hijos
se tiene todo el miedo del planeta
todo el miedo a los hombres luminosos
que quieren asesinar la luz y arriar las velas
y ensangrentar las pelotas de goma
y zambullir en llanto los ferrocarriles de cuerda.
Cuando se tienen dos hijos
se tiene la alegría y el ¡ay! del mundo en dos
cabezas,
toda la angustia y toda la esperanza,
la luz y el llanto, a ver cuál es el que nos llega,
si el modo de llorar del universo
o el modo de alumbrar de las estrellas.
En: “Giraluna” (1955)
Passeando com o pai
(Vickie Wade: pintora norte-americana)
Os Filhos Infinitos
Quando se tem um filho,
se tem o filho da casa e o da rua inteira,
se tem o que cavalga no quadril da mendiga
e o do carrinho que a governanta inglesa empurra
e o menino gringo que a crioula carrega
e o menino branco que a negra carrega
e o menino índio que a índia carrega
e o menino negro que a terra carrega.
Quando se tem um filho, se têm tantos meninos
que a rua se enche
e a praça e a ponte
e o mercado e a igreja;
e é nosso qualquer menino quando atravessa a rua
e o carro o atropela
e quando se debruça na sacada
e quando se aproxima da piscina;
e quando um menino grita, não sabemos
se o nosso é o grito ou é o menino,
e se lhe sangram e se queixa,
em tal momento não saberíamos
se o ai! é seu ou se o sangue é nosso.
Quando se tem um filho, é nosso o menino
que acompanha a mulher cega
e as Meninas e a própria anã
e o Príncipe de França e sua Princesa
e o que Santo Antônio tem nos braços
e o que a Senhora de Coromoto tem sobre as pernas.
Quando se tem um filho, toda risada nos inunda,
todo pranto nos exaspera, venha de onde venha.
Quando se tem um filho, se tem o mundo por dentro
e o coração por fora.
E quando se têm dois filhos
se têm todos os filhos da terra,
os milhões de filhos com que as terras choram,
com que as mães riem, com que os mundos sonham,
os que Paul Fort queria com as mãos unidas
para que o mundo fosse uma cantiga de roda,
os que o Homem de Estado, que tem um belo menino,
quer com Deus por dentro e as entranhas por fora,
os que escaparam de Herodes para cair em Hiroshima
com os olhos entreabertos, como as crianças da
guerra,
porque basta uma fenda chinesa ou um olhar japonês
para que saia toda a luz de um menino.
Quando se têm dois filhos
se tem todo o medo do planeta,
todo o medo dos homens luminosos
que querem assassinar a luz e arriar as velas
e ensanguentar as bolas de borracha
e mergulhar em pranto os trens de corda.
Quando se têm dois filhos
se tem a alegria e o ai! do mundo em duas cabeças,
toda a angústia e toda a esperança,
a luz e o pranto, a ver qual é o que nos chega,
se o modo de chorar do universo
ou o modo de brilhar das estrelas.
Em: “Giralua” (1955)
Referência:
BLANCO, Andrés Eloy. Los hijos
infinitos. In: __________. Poesía. Compilación y prólogo de Domingo
Miliani. Cronología y bibliografía por Rafael Ángel Rivas Dugarte. Caracas, VE:
Fundación Biblioteca Ayacucho, mar. 2007. p. 178-179. (‘Biblioteca Ayacucho’;
v. CCXXXIV)
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