Szymborska reflete ironicamente sobre o cânone de beleza contemporâneo – no qual o descarnado, quase anoréxico, prepondera –, confrontando-o aos antigos – ao barroco, em especial – no qual as pessoas, as mulheres no caso, são representadas com largas polpas, em formas ovaladas e poucas roupas, a acentuar a já manifesta e hiperbólica sensualidade.
Para quem interessar possa, basta empreender uma excursão ao Louvre, em Paris (FR), e adentrar a sala com pinturas de Rubens (1577-1640), nomeada “Galerie Médicis”: ali poderá ratificar, em boa medida, os assentamentos e as inflexões da poetisa polonesa – e ratificar como os gostos, o estilo, o espírito de uma determinada época, como a barroca, podem tender à mais ostensiva carnalidade.
J.A.R. – H.C.
Wisława Szymborska
(1923-2012)
Kobiety Rubensa
Waligórzanki, żeńska fauna
jak łoskot beczek nagie.
Gnieżdżą się w stratowanych łożach,
śpią z otwartymi do piania ustami.
Źrenice ich uciekły w głąb
i penetrują do wnętrza gruczołów,
z których się drożdże sączą w krew.
Córy baroku. Tyje ciasto w dzieży,
parują łaźnie, rumienią się wina,
cwałują niebem prosięta obłoków,
rżą trąby na fizyczny alarm.
O rozdynione, o nadmierne
i podwojone odrzuceniem szaty,
i potrojone gwałtownością pozy
tłuste dania miłosne!
Ich chude siostry wstały wcześniej,
zanim się rozwidniło na obrazie.
I nikt nie widział, jak gęsiego szły
po niezamalowanej stronie płótna.
Wygnanki stylu. Żebra przeliczone,
ptasia natura stóp i dłoni.
Na sterczących łopatkach próbują ulecieć.
Trzynasty wiek dałby im złote tło.
Dwudziesty – dałby ekran srebrny.
Ten siedemnasty nic dla płaskich nie ma.
Albowiem nawet niebo jest wypukłe,
wypukli aniołowie i wypukły bóg –
Febus wąsaty, który na spoconym
rumaku wjeżdża do wrzącej alkowy.
Vênus e Cupido
(Peter Paul Rubens: pintor flamengo)
As mulheres de Rubens
Herculinas, fauna feminina,
nuas como um ribombo de barris.
Aninham-se em leitos pisados
dormem de boca aberta para cocoricar.
Suas pupilas fugiram para o fundo
e penetram no interior das glândulas,
donde os fermentos se infiltram no sangue.
Filhas do barroco. Incha a massa na gamela,
banhos soltam vapor, vinhos enrubescem,
galopam pelo céu leitões de nuvens,
trombetas estrondeiam o alarme físico.
Ó aboboradas, ó desmesuradas
e duplicadas pela renúncia das vestes
e triplicadas pela violência da pose,
pratos gordurosos do amor!
Suas irmãs magras levantaram mais cedo,
antes que clareasse no quadro.
E ninguém viu quando seguiram em fila
do lado não pintado da tela.
Banidas do estilo. Costelas à mostra,
pés e mãos de pássaros.
Tentam voar nas espáduas salientes.
O século treze lhes daria um fundo dourado.
O vinte – uma tela prateada.
O dezesseis não tem nada para as retilíneas.
Porque até mesmo o céu é bojudo
bojudos os anjos e bojudo o deus –
um Febo bigodudo que num corcel suado
cavalga para a alcova fervente.
Referência:
SZYMBORSKA, Wisława. Kobiety Rubensa /
As mulheres de Rubens. Tradução de Regina Przybycien. In: __________. Um
amor feliz. Seleção, tradução e prefácio de Regina Przybycien. 1. ed.
Edição bilíngue. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2016. Em polonês: p. 90 e
92; em português: p. 91 e 93.
Nenhum comentário:
Postar um comentário