Primeiramente, há de se observar a transformação topológica do poema, que, partindo de uma estrofe com dezesseis versos alexandrinos e 192 sílabas poéticas ao todo, passou a oito quadras ou 32 versos hexassílabos, com as mesmas 192 sílabas poéticas: apesar de a paráfrase elaborada pelo tradutor haja transfigurado o original de Hugo, não deixa de ser surpreendente a manutenção do escopo quantitativo numérico do poema no idioma destinatário.
No mais, a voz poética entoa loas ao Brasil, com aquele mesmo tom com que o vienense Stefan Zweig (1881-1942) propusera em sua obra “Brasil, País do Futuro”, de 1941, vale dizer, enquanto a França de Hugo pertenceria à velha Europa já no inverno de seus dias, o Brasil – “florão da América / iluminado ao sol do Novo Mundo” – se encontraria na primavera, com um longo caminho ainda a trilhar.
Passados pouco menos de 140 anos desde a redação do poema, nada se vislumbra no momento presente que caracterize o estágio de “Progresso, Força e Clareza” lobrigado pelo autor francês, antes, o que vemos todos os dias é o país submergindo no obscurantismo mais daninho das “fake news” palacianas!
J.A.R. – H.C.
Victor Hugo
(1802-1885)
J’aime votre patrie (*)
J’aime votre patrie au ciel toujours pur,
Paradis qui se berce entre les flots d’azur,
Où le soleil brûlant, comme un phare féerique,
Couvre de ses rayons le sol de l’Amérique.
Vous êtes le printemps et moi, je suis l’hiver;
Je suis le soir tombant, vous le jour frais et
clair,
Et j’aime à regarder l’aurore s’épanouir.
Oui! je sens de la force et de la joie me venir
À vous voir. Vous croissez. L’Europe, le vieux
monde,
Dans l’histoire a vécu la rapide seconde
De sa vie. Vous serez l’Europe, après-demain.
Le moment est critique. Eh! bien, prenez la main
De l’Avenir puissant qui vous attend.
Alors, Dans ce vaste Brésil aux arbres semés d’or,
Passeront le Progrès, la Force et la Clarté:
On voit sur votre front une aurore d’été.
O descobrimento da terra
(Cândido Portinari: pintor paulista)
Aos Brasileiros
Eu amo a vossa pátria
De céu adamantino
Em nuvens azuladas,
O Éden peregrino!
Eu amo vosso sol,
Ardente, soberano,
Que cobre deslumbrante
O sol americano;
Vós sois a primavera,
O dia ameno e puro,
Eu sou a triste tarde
Do inverno taciturno;
Eu amo a luz da aurora,
Ao vê-la se expandir,
E sinto ao contemplar-vos
Minha alma reflorir.
Cresceis agigantados!
A Europa, o velho mundo
Traçou a sua história
Num rápido segundo;
Sereis a Europa, um dia,
Hoje, amanhã, talvez.
Vencei os dias maus,
Marchai com rapidez;
Vós tendes pela frente
Futuro deslumbrante;
Nas vossas matas de ouro
Se escuta sussurrante.
O sopro do progresso,
Da força, – luz e brio,
Cintila em vossas frontes
Uma aurora de estio!
Nota:
(*) Este poema, datado de 1883: (i) foi publicado no Jornal do Brasil, em 27.2.1902; (ii) foi enviado por Victor Hugo ao Clube Republicano do Estado da Paraíba, à época de sua criação; (iii) não tendo sido publicado em nenhuma coleção póstuma, não consta na íntegra das obras do autor francês.
Referências:
Em Francês
HUGO, Victor. J’aime votre patrie. Disponível neste endereço. Acesso em: 15 abr. 2021.
Em Português
HUGO, Victor. Aos brasileiros. Tradução
de Nuno Álvares. In: TEIXEIRA, Múcio (Org.). Hugonianas: poesias de
Victor Hugo traduzidas por poetas brasileiros. 2. ed. Rio de Janeiro: Imprensa
Nacional, 1885. p. 329-331.
Nenhum comentário:
Postar um comentário