Alpes Literários

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Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 29 de julho de 2021

Jean Cocteau - Se amas, pobre criança

O falante dirige-se a uma criança – real ou, talvez, até mesmo assim percebida, ainda que não necessariamente um infante no sentido estrito da palavra –, fazendo-lhe observações sobre a conduta que leva ao amor, resultado inopinado de leis próprias de gravitação capazes de fazer os corpos – quer astros quer simples humanos – atraírem-se.

O amor tanto inebria o(a) amante, que este já não consegue sopesar com precisão sobre aquilo que está à volta – livros, paisagens, céus da Ásia: tem os olhos direcionados tão apenas ao objeto de sua afeição – o(a) amado(a) – e o coração como que anestesiado, sujeitando-se a descer um elevador depressa demais, expondo-se a percalços que a razão, por bem ou por mal, desconsidera.

J.A.R. – H.C.

 

Jean Cocteau

(1889-1963)

 

Si tu aimes mon pauvre enfant

 

Si tu aimes mon pauvre enfant,

Ah! si tu aimes!

Il ne faut pas en avoir peur.

C’est un inéfable désastre.

Il y a un mystérieux système

Et des lois, et des influences,

Pour la gravitation des cœurs

Et la gravitation des astres.

On était là tranquillement

Sans penser à ce que l’on évite,

Et puis tout à coup on ne peut plus,

On est à chaque heure du jour

Comme si tu descends très vite

En ascenseur:

Et c’est l’amour.

Il n’y a plus de livres, de paysages,

De désir des ciels d’Asie,

Il n’y a plus qu’un seul visage

Auquel le cœur s’anesthésie,

Et rien autour.

 

Templo de Angkor Wat:

Camboja, Sudeste da Ásia

(Autoria não identificada)

 

Se amas, pobre criança

 

Se amas, pobre criança,

ah! se tu amas?

Não tenhas medo, não:

é inefável desastre.

Há um misterioso sistema,

e leis e influências

na gravitação das almas

e na gravitação dos astros.

Estás assim, tranquilamente,

sem pensar no que evitas,

e de repente, já não aguentas mais,

é como se a cada instante

descesses bem depressa

de elevador:

e é o amor.

Nem livros mais, nem paisagens,

nem desejos de céus da Ásia.

Sobra aquele rosto – aquele

ao qual se anestesia o coração.

E nada em torno.


Referências:

Em Francês

COCTEAU, Jean. Si tu aimes mon pauvre enfant. Disponível neste endereço. Acesso em: 25 jul. 2021. 

Em Português

COCTEAU, Jean. Se amas, pobre criança. Tradução de Sérgio Milliet. In: MILLIET, Sérgio (Seleção e Notas). Obras-primas da poesia universal. 3. ed. São Paulo, SP: Livraria Martins Editora, 1957. p. 426-427.

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