Amigos e inimigos do falante agora se unem no degredo, num ciclo da existência que desde logo se mostra finado para aquele que não se sente um “escolhido” dos deuses – ou não abrigado em seus círculos –, com o que se relativiza tê-los tido numa condição ou noutra, tanto mais que centrado em si mesmo e em seus “íntimos infernos”.
Tem-se um sentir à volta de certo remorso em relação aos mortos, plasmado em “mágico convívio”, remorso que erode o espírito lentamente e que, por fim, o falante acaba por assimilar à sua própria individualidade: servido de amigos e inimigos – e já distante de grande parte deles –, paira, em relação a estes, um sopro eremítico e elegíaco nas palavras de que lança mão o poeta.
J.A.R. – H.C.
Carlos Nejar
(n. 1939)
Aos amigos e inimigos
De amigos e inimigos
fui servido,
agora estamos unidos,
atrelados ao degredo.
Nunca fui o escolhido
onde os deuses me puseram.
Nem sou deles, sou de mim
e dos íntimos infernos.
Não.
Não me entreguem aos mortos,
os filhos que me pariram
e plasmei com meus remorsos
no seu mágico convívio.
De amigos e inimigos
fui servido
e com tão finada vida
e alegados motivos,
que ao dar por eles, já partira
e quando dei por mim, não estava vivo.
Amigos
(Dietrich Schuchardt: pintor alemão)
Referência:
NEJAR, Carlos. Aos amigos e inimigos. In:
GARCÍA, Xosé Lois. Antologia da poesia brasileira / Antología de la poesía
brasileña. Edición bilingüe. Santiago de Compostela, Galiza, U.E.:
Laiovento, 2001. p. 284.
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